O debate dos presidenciáveis no país do futebol
Na 5ª feira dia 05 de agosto do corrente ano o país pôde assistir ao primeiro debate entre os quatro mais destacados candidatos à Presidência da República. Simultaneamente a exibição do embate televisivo, a emissora líder transmitia um jogo de futebol de grande relevância. Era a crônica do desastre anunciado.
É de praxe afirmar ser o Brasil o país do futebol, haja vista o número de horas de programação dedicadas quase exclusivamente para este esporte que movimenta recursos astronômicos. Também é comum ouvirmos que os brasileiros não se interessam pela política em nenhum aspecto.
Infelizmente, os números de medição de audiência instantânea, organizados pelo Ibope em domicílios da Grande São Paulo, dão a prova material dos ditados populares. Os números indicam que o debate oscilou entre 2,5 e 5 pontos; enquanto a partida teve média de 29,5 atingindo um pico de 33,8 pontos. Nada de novo no front.
Até onde se sabe, os candidatos são assessorados por competentes profissionais. Receberam treinamento para a mídia, de postura diante do vídeo, realizaram sabatina prévia de perguntas e passam por algum preparo em oratória. Enfim, estavam tecnicamente preparados para suas performances.
O problema pode estar aí. Mesmo que exista uma discórdia de conceitos estratégicos e idéias-guia, não há desavença na forma. Para a maioria do eleitorado, distante da política por três anos e meio e convocado a decidir sobre temas complexos encarnados nas candidaturas, a relação é muito desigual.
Ao mesmo tempo, desafio um oponente do futebol a provar que se trata de atividade desprovida de inteligência. Em geral, uso o exemplo das quatro linhas em sala de aula. Uma parte considerável dos brasileiros, para além de paixões torcedoras ou ódios contra cartolas e dirigentes, entende e muito a respeito de temas complexos.
Cidadãos comuns, quando familiarizados com um jargão apropriado e participando de uma cultura própria, conseguem emitir opinião a respeito de estratégia, tática, desempenho dos indivíduos, ambiente coletivo, qualidade das lideranças, investimentos em contratações oportunas ou equivocadas e assuntos do gênero. As variáveis de possibilidades e as tramas diretas e indiretas são muitas, exigindo no mínimo uma mente treinada.
Na política poderia acontecer o mesmo, se e caso camadas mais abrangentes do povo brasileiro fizessem política ao longo do ano. Acontece que o “excesso de participação” é visto como algo “perigoso”, pois aumenta o poder de grupos de pressão que não são naturalizados como sendo os únicos legítimos para isso. O fosso está justamente na agenda discreta, ou quase indecifrável. Poucos sabem que o PIB brasileiro está em torno de R$ 3,143 trilhões, dos quais cerca da metade passa pelo caixa da União. No orçamento executado em 2009, segundo dados do SIAFI, o Brasil gastou 2,8% de sua receita com Educação e “apenas” 35,57% da dívida pública (isso sem contabilizar o refinanciamento). Portanto, é falsa a polêmica do aumento de despesa da máquina pública como causadora de déficit. O rombo está na forma de financiamento do Estado brasileiro, e por tabela, do conjunto das políticas que punem ou beneficiem agentes econômicos e sociais.
Se fossem compreensíveis estes números e estivesse em jogo o modelo de sustentar a sociedade brasileira, não estaríamos lamuriando a pouca audiência de um debate de presidenciáveis. Enquanto isso não ocorrer, teremos o paradoxo brasileiro de ver a política como sazonal e o futebol como permanente. Quem planta colhe.
Bruno Lima Rocha é cientista político www.estrategiaeanalise.com.br /blimarocha@via-rs.net
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