sexta-feira, 4 de junho de 2010

Por que nós sempre perdemos para Garotinho?

Parte II- a nossa miséria moral
Continuando o post anterior sobre o tema, poderíamos dizer que a primeira causa que se destaca é o tamanho deste “nós”. É uma classe espremida entre classes muito mais poderosas, seja por causa do contingente numérico da classe que está logo abaixo ou pelo poder financeiro e simbólico da classe que está acima. Desse modo é quase impossível esta classe conseguir impor seus valores e interesses de classe neste jogo. E aí começa todos os seus erros, e o maior deles é a suposição que todas as outras classes vêem o mundo da política tal como eles, ou nas melhores intenções, deveria vê-lo.
Como suas necessidades básicas de sobrevivência já estão solucionadas, acreditam que a política é um espaço, sobretudo, de realização do imaginário “religioso”- moral, o que também é uma afirmação simbólica do estilo de vida engendrado pela classe. O principal produto desta relação com a política é a implementação de uma cruzada moral como sendo o elemento principal da agenda política, ou seja, todos os outros aspectos da política são secundários em relação ao desejo de moralização do mundo. E essa moralização se daria segundo os valores morais desta classe, claro!
Assim, seu projeto político para a nossa sociedade é: uma sociedade que seja capaz de montar um sistema de controle e punição eficiente que puna os “maus” e permita que os “homens de bem” reinem em paz sobre a terra. Essa visão simplista do mundo é sustentada em dois pilares: moralismo voluntarista e um forte casamento entre judiciário e aparato policial.
Do ponto de vista político eleitoral local isso é um fracasso, justamente porque não leva em conta os anseios e interesses das outras classes, assim é incapaz de seduzir fatias consideráveis da sociedade a ponto de se tornar um projeto robusto. Enfim, esse “nós” só fala pra si mesmo.
Os setores que estão abaixo desta classe têm anseios muito mais urgentes de serem solucionados do que propõe esse “nós”. A alimentacao do seu filho, o direito dele ter uma escola digna, ter uma profissão, poder ter um trocado para se divertir ou comprar um tênis da moda são mais importantes (óbvio!) do que moralizar o mundo. A insensibilidade desse “nós” que não enxerga um palmo além de sua classe é a principal causa do seu fracasso.
Por outro lado, essa tão sonhada moralização não interessa os setores de classe que estão acima. Afinal, muito dos negócios das classes altas necessitam de uma visão moral mais flexível do que propõe esse “nós”. No máximo adotam cinicamente o discurso da cruzada moral da classe média, sabendo que isso não se aplica a seu mundo, e que por baixo jamais apoiarão um projeto assim. Mais uma vez essa classe média está sozinha e desamparada em virtude de sua miopia política.
Neste jogo, ainda tem o temor que a classe média tem em relação à ascensão das classes pobres. Temem pela perda de um dos bens mais caros a estes animais simbólicos que somos nós, os humanos, ou seja, temem a perda dos bens simbólicos que legitimam nosso estilo de vida e garantem parte do sentido de nossa existência. É onde a irracionalidade entra na política, fazendo com que tomemos posições cruéis em defesa do espaço simbólico de nossa tribo.
Nesta luta em que “escolhas” afetivas ditam a disputa política, a classe média demoniza imediatamente qualquer política que ofereça o mínimo de dignidade às classes que estão abaixo, como também criam barreiras simbólicas (entre elas preconceitos) para garantir-lhes os privilégios adquiridos. (Falar sobre isso exige no mínimo mais dez pots).
Para finalizar, e deixar mais espaço para o debate, podemos dizer que Garotinho nos vence sempre porque ele, por pior que seja, por mais vil, vingativo, mesquinho, megalomaníco e sei lá mais o que, ele é muito melhor para a maioria da sociedade do que “nós” temos a apresentar à sociedade. Mesmo que em nenhum momento ele tenha pensado em elaborar políticas públicas que gerasse transformações profundas na sociedade no que se refere mobilidade social dos pobres como ocorreu no governo Lula (27 milhoes de pessoes saíram da pobreza), ou também que ele privatiza a prefeitura deixando margem para esquemas duvidosos, ele foi muito melhor para os pobres do que um projeto de “moralização do mundo” poderia ser. Não há como negar que projetos como “café-da-manha no trem”, “restaurante popular” e mesmo o discutível “cheque cidadão” tragam alguns preciosos benefícios aos setores mais pobres da população, enquanto a classe média oferece para estes setores um pacote de preconceito, polícia repressiva, cadeia e no melhor dos mundos um projeto de tutela destas classes, já que sugere sempre que ela não sabe votar. Enfim, Garotinho tem um projeto para eles, que pode ser questionável, mas ele tem. Assim ele reconhece de alguma maneira o papel das classes mais pobres no jogo político, a classe média soberba e infantilmente não reconhece o papel deles na política, os ignora.
Por outro lado, mesmo com o imenso ódio de classe que as elites tenham de Garotinho, ele soube dominá-las apresentando uma relação política que é de alguma forma vantajosa para essas classes. (Longe de querer defender Garotinho, imagino a dor desta elite em ter que negociar com tipo popularesco como ele.)
E “nós” temos o que para apresentar? Uma cruzada moralista, que além de míope e insensível, beirando a crueldade quando gastamos toda nossa energia para isso e esquecemos de necessidades maiores de nossa população, é pouco, muito pouco para seduzir a sociedade.

7 comentários:

douglas da mata disse...

Apenas um reparo:

Ele(o "chefe")reconhece a ralé estrutural(muito ao gosto do Fabrício)mas não a incorpora em seu projeto, senão para dirigir suas demandas.

Não creio que assumir a "culpa" pela nossa ausência de "projeto", implique em tentar jogar com as ferramentas do populismo-evangélico.

Essa tentativa tem sido levada à cabo pelo PT local, e é um desastre.

Talvez se ainda resgatássemos um pouco dessa nossa agenda moralista(que nos dá base e uma coesão de classe), para que possamos extrapolar esses limites que essa mesma agenda nos impõe, seja a solução para nosso impasse.

Não custa lembrar que HOJE, nessa cidade, a reconstrução de certos valores é fundamenttal para reerguer o simbolismo dos ritos democráticos, que foram achincalhados.

Isso não quer dizer um projeto neoudenista, mas é preciso dar um basta nesse bacanal político que se tornou essa cidade.

Na verdade, o contexto estrutural do garotismo que você cita, com seus projetos, também se encontra em crise e diluído nos meios que viraram fins em si mesmos.

Um abraço.

Brand Arenari disse...

Douglas,
eu nao disse que ele é bom para a “ralé-estrutural”, apenas disse que ele é melhor ou “menos pior”. E isso se dá por duas coisas: a primeira é o efeito material das migalhas sociais que ele lança a essa classe e segundo o efeito simbólico disso. Quanto ao efeito material, essas migalhas aliviam as necessidades alarmantes desta classe e no plano simbólico elas geram uma espécie de “reconhecimento social”. Gera o sentimento de “eu existo” numa classe carente e abandonada por séculos. Essa classe, ao contrário do que a classe média pensa, entende muito bem do jogo político, e sabe qual é o sentimento que a classe média tem dela.

E quanto a isso, quem acha que Garotinho e Lula são a mesma coisa é quem irracionalmente rejeita qualquer forma de política que atenda classes mais baixas. Para estes toda política para os pobres é igualmente ruim. Os pobres sabem muito sobre este sentimento que estes setores tem sobre eles, e por isso estarão sempre contra.

Quem é o ingênuo nesse jogo essa classe média ou os pobres?

Não proponho a adoção do estilo garotinho, mas sim a elaboracao de um discurso político que atenda as demandas dessa classe, que não seja apenas a repressão e a tutela cínica.
Eu também não sou contra a luta contra a corrupção (sei lá o que seja isso), o não acho que essa luta deve ter o tamanho que tem na agenda política. O termo corrupção é u termo vazio que se aplica a quase td, não defina nada é um termo moderno para a termo pecado. Mas isso é uma outra grande discussão.

Por último concordo com vc que vivemos uma situação sem precedentes em Campos e precisamos concentrar fogo nisso, mas não acho que uma cruzada moral e personalista, que fala em homens de bem e caráter possa nos ajudar muito.

Um grande abraço.
Obs: meus exércitos estão a beira da capitulação.

douglas da mata disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
douglas da mata disse...

eu já preparo minha retirada...não me rendo, mas tampouco desejo mais lutar...não há o porquê...

é hora de sair de cena...até para preservar algo, quem sabe uma volta pela "sierra maestra"?

diário de bordo:

aos 06 de junho de 2010, colocamos as últimas minas defensivas na trilha que leva ao nosso acampamento, do tipo "bloody-mary". Os suprimentos acabaram, e restam poucas cargas ofensivas, alguns obuzes de 105 mm, três metralhadoras ponto 60, alguma munição, 42 fuzis Ak-47, 08 M-16, 23 sub-metralhadoras Uzi, 09mm, 56 granadas...pouco alimento, para o corpo, nenhum para a "alma"...

mas o que nos mais falta é vontade de seguir lutando...

resta incediar tudo o que foi feito, ou escrito...

o suícidio ainda é uma alternativa...a outra é reincorporarmos a vida civil: ver TV aberta, empaturrarmos de carboidratos e cerveja, um casamento sólido(porém pesado, como uma âncora), filhos, um salário e uma boa dose da vacina contra a rotina: mediocridade. Ou o que alguns chamam de: felicidade. Tanto faz...

Brand Arenari disse...

Notícias do front

Na trincheira de cá a situação é pior. Como vc pode ver, mais da metade do pelotão já bateu em retirada. Só restam umas granadas velhas com o pino emperrado, munição ainda tem razoável, mas falta quem atire. A situação é terrível.
Uma saída é unirmos as forcas que nos restam e tentar uma outra tática de guerra, que não vise resultados imediatos, mas ao menos guardem nossas restantes posições, ao invés de uma retirada total.
Quanto a isso falo na possibilidade de nos reunirmos e montarmos uma revista eletrônica semanal, que não seja só de opiniões, mas também produza reportagens e entrevistas e colunas fixas sobre assuntos variados. E quem sabe um dia ela não se torna impressa. . .

Na podemos esquecer que os blogs já não são mais um espaço só alternativo, sobretudo em Campos, essa rede está sendo invadida pela lama do “garotismo”.

Um abraco

Anônimo disse...

Ta mesmo Brand...
Ate ave de rapina ja tem blog na planicie...

Anônimo disse...

É muito fácil. A compra de votos. Ponto!