A manipulação de imagens no intuito de „comprovar“ a tese da agressão a José Serra deveria ter sido o fundo do poço de nossa grande mídia, sobretudo das Organizações Globo. Mas não é o fundo do poço, pois parece não haver limites para este tido de imprensa, que se julga dona da verdade, a ponto de poder dar a ela a roupagem que bem entende. Não se trata apenas de que “a Globo mente”, que manipula a informação como quer, sem nenhuma autocrítica. Autocrítica? Isto, não visão deles, se resume ao esforço de corrigir erros ortográficos e gramaticais. O problema, muito maior, é que a Globo nos impôs o seu padrão de qualidade e que este padrão representa a obstrução do debate sobre os grandes temas (rechaçados pelo “padrão Globo” como “temas polêmicos”) em favor da novelizacão da opinião pública. As Organizações Globo representam um entrave para nosso aprendizado político. O padrão de concorrência que impõe não deixa espaço para que a sociedade seja escandalizada com seus problemas mais importantes, sendo obrigada a se escandalizar com “bolinhas de papel”.
Como somos levados a nos ocupar com uma variedade de escândalos durante estas eleições gerais, sem que a “questão social” nos escandalize? Como é possível que um país marcado pelo abismo de classes e pela segregação étnica de diversas esferas sociais – apesar dos avanços recentes – não torne estas questões o foco do debate público? Só vejo uma resposta: temos uma imprensa, uma “estrutura da esfera pública” (Habermas) que se define pela oclusão destes “temas polêmicos” da pauta de produção sistemática de notícias e escândalos. Quando digo que o problema de nosso aprendizado político é a Globo e seu “padrão de qualidade” que se alastra pela imprensa, isento sim os candidatos, Dilma e Serra: a “questão social” como pauta foi abraçada pelos dois como eixo de campanha, ainda que não com a mesma credibilidade quando se trata de um “abraço tucano”. Mas isso jamais foi discutido pela imprensa. Não se discute os ganhos e os dilemas das atuais políticas. Ou se tenta demonizá-las, ou não se fala delas na grande mídia.
Não posso obviamente deixar de olhar a imprensa brasileira com os parâmetros do que vejo acontecer na imprensa alemã. Neste outono a imprensa alemã, especialmente jornais de maior qualidade como o “Die Zeit, se encontra inserida num debate cotidiano sobre os dilemas da “cultura e da nação alemã” face ao desafio de “integrar os muçulmanos”, sobretudo os turcos, que já contam como uma parcela expressiva da população. Neste debate há a posição firmada (inclusive pela chanceler Angela Merkel) de que a “cultura dominante” do país é e deve seguir sendo a “judaico-cristã” ; ou ainda a de que o país “não precisa mais de migrantes de outros círculos culturais”. Já a imprensa pauta a discussão tentando situar o tema da “integração dos imigrantes” no debate de longa duração sobre o projeto de nação do País. “Que país queremos ser? Uma ilha isolada de “pureza cultural” ou uma democracia multicultural como os EUA? “Como vamos lidar com o problema da inclusão social dos não suficientemente incluídos”? Não acho que os ventos aqui soprem em boa direção. A xenofobia cresce no país, sobretudo o “anti-islamismo”. Mas a imprensa está interessada em discutir o curso dos ventos, e por isso coloca questões sobre o projeto de nação que deve ou não ser seguido. Onde estão as questões nacionais na pauta da imprensa brasileira? Onde se discute inclusão social entre nós? Como é possível se preocupar com o “fortalecimento de instituições democráticas e republicanas” sem tocar no tema da inclusão dos excluídos nestas instituições?
Podemos dizer, com pouco medo de errar, que os candidatos, Dilma e Serra, se aproximam muito mais de nossos problemas do que a imprensa e que até nossos políticos estão mais perto de escandalizar a sociedade com a “questão social do que nossos jornalistas e seus “colegas-patrões”.
Um comentário:
O ponto do aprendizado político é fundamental, pois a campanha tucana e a parte da mídia a ela aliada o entravam na medida em que subestimam a capacidade de raciocínio das classes populares.
não passa de expressão inevitável do preconceito de classe predominante no partido e na emissora.
Definitivamente, é o único motivo para a raiva e o desespero demonstrados pela campanha da direita.
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