George Gomes Coutinho
Os blogs em sua diversidade normativa, com a conseqüente pluralidade de temas e posturas derivadas, representam eletronicamente aquilo que é encontrado na própria modernidade. Não há um pensamento único. Não há uma única fonte interpretativa. E todo tipo de tentativa de construção narrativa em caminho oposto deve ser vista sob o signo da mais pura desconfiança. As perigosas fontes do fascismo, que demarcam anacronicamente a reivindicação de elementos de verdade/validação valorativamente únicos, estão aí nos umbrais a nos espreitar.
Todavia desde ontem a maioria intrinsecamente plural do conjunto de blogs que constitui a rede campista, mesmo em sua diversidade, apresentou uma voz em uníssono. Motivados pela ação judicial contra o professor Roberto Moraes do Instituto Federal Fluminense impetrada pelo grupo “Folha” de Campos dos Goytacazes, onde há maiores explicações aqui e aqui, os autores da rede de blogs, justificadamente com virulência, bradaram contra o que interpretam como uma tentativa de censura do grupo de comunicação à liberdade de expressão. Neste ínterim o jornalista Vitor Menezes, um dos urgentistas, revela no espaço público virtual que também sofre uma ação judicial movida pelo mesmo grupo (ver aqui).
Antes de qualquer coisa afirmo minha concordância com o diagnóstico dos colegas blogueiros e identifico um indefectível traço de mordaça nas duas ações. Mas, como é praxe, decidi problematizar um pouco.
Como eu mesmo ventilei alhures, acredito piamente que vivemos um outro momento das tecnologias de informação com uma descentralização sem paralelo dos meios de comunicação. Nem regimes fechados tem obtido eficiência absoluta do controle contra os diversos meios disponíveis, vide a denúncia das irregularidades nas últimas eleições iranianas que giraram o mundo até mesmo pelo Twitter. Esta, portanto, é uma tendência incontornável e devemos compreender que meios de regulação que não compreendam a acelerada dinâmica destas vias estão fadados ao fracasso. Nestes termos saúdo os debates no legislativo sobre a entrada da internet como meio lícito e lucidamente regulado, ainda que experimentalmente, nas próximas eleições brasileiras. A entrada deste debate na agenda política “tradicional” ou “formal” mostra o reconhecimento destes grupos dos potenciais ainda inexplorados da grande rede em uma realidade de constituição tardia e incompleta da esfera pública.
Portanto isto implica que não estou incentivando o uso leviano e/ou difamatório dos blogs ou da internet como um todo em um sentido político. Eu particularmente acredito que seja desejável uma minima moralia, uma "pequena moral", como ironicamente Adorno fez alusão a Aristóteles e a sua Grande Moral. A “pequena moral", nos blogs independentes, deve perpassar um pequeno conjunto de procedimentos básicos em prol da livre e irrestrita circulação de idéias que possa estimular amplos debates.
Neste espírito reprimi o que considerei a demonstração de devaneios narcisistas que obscureciam os debates em prol do bom desenvolvimento dos mesmos. Todavia jamais poderia ser favorável a um uso despótico dos blogs enquanto meio, onde se obscureçam elementos importantes e pertinentes ao esclarecimento de elementos que dizem respeito à vida dos cidadãos. Nestes termos, a exigência de supressão de informações na ação movida pelo grupo “Folha” de Campos dos Goytacazes implica um ataque frontal ao direito de livre informação dos cidadãos. E igualmente um insulto àqueles que ambicionam trazer elementos da sociedade civil, e para esta, visando deflagrar fluxos comunicativos e a reflexividade necessárias para este exercício cotidiano de construção pari-passu da esfera pública.
Não soa como algo exatamente chocante o uso do direito em um sentido autoritário em nossa realidade. O corpus jurídico é dúbio,mais ainda na realidade periférica, sendo não poucas vezes utilizado como via de referendar os caprichos e desejos particularistas dos “sobrecidadãos” descritos pelo jurista/sociólogo Marcelo Neves. Aos “subcidadãos”, o outro lado da medalha, cabe a única relação possível: a violência do aparato coercitivo estatal.
De toda forma recomendo a retirada imediata das ações judiciais impetradas contra Roberto Moraes e Vitor Menezes. Estas são máculas inaceitáveis para um grupo de comunicação digno deste nome, onde detecta-se um lastro autoritário simplesmente inviável de ser mensurado e representa, anacronicamente, a manutenção das tradições de intolerância e censura que encontram-se na via oposta do Estado democrático de direito. A retirada das ações implica um gesto elegante de reparação aos danos provocados.
Todavia considero que temos aqui um divórcio insanável. Nós, os organizadores da cultura, como diria o comunista sardo Antonio Gramsci, assim como os produtores diretos de bens simbólicos de toda ordem, precisamos tanto da livre circulação de informações quanto as plantas necessitam de solo e água para seu desenvolvimento. Difícil não reconhecer que, como cientista social e defensor do mais amplo e irrestrito aprofundamento das liberdades democráticas, nos encontramos em lado oposto ao do grupo Folha. E nestes termos apóio irrestritamente as justas sanções que se façam necessárias. Mas, de forma diversa ao que procede usualmente no referido jornal, garanto que se houver o desejo de manifestação de uma contra-versão dos fatos este espaço está democraticamente garantido. Pois é nas esferas de produção e circulação de comunicação que estes elementos devem ser apresentados. E não em mais este lamentável episódio de judicialização absolutamente negativa das relações sociais.
5 comentários:
George, esta certamente será a primeira de outras intervenções que devem se somar na blogsfera local, devido à gravidade dessa violação das liberdades públicas a que a "rede blog" é alvo. Adiro ao seu ato de protesto e me solidarizo ao Roberto Moraes e ao Vitor Menezes.
Creio que td que faltava para uma ainda maior afirmação dos blogs em Campos, assim como, para fortalecer a politização entre os blogs era isso. Além de demonstrar meu apoio ao R. Moraes, só posso dizer outra coisa: OBRIGADO “FOLHA”.
O ataque ao amigo Roberto Moraes
Conheci o Roberto Moraes na infância, pois fomos colegas de curso primário. Desde então uma amizade que era uma hernça da amizade de nossos pais, Clóvis Tavares e Joêmio Pessanha, permanece viva.
O trabalho de informação ética e saudável que Roberto vem fazendo em Campos criou uma série de conjunções que resultaram entre outras coisas na Rede Blog, capitaneada pelo nosso amigo Vítor Menezes.
É extremamente melancólico assitir a esse triste episódio que assume a forma de uma ação judicial em que um veículo de oponião pública outrora respeitável, se entrega agora, denunciando publcamente o seu ocaso existencial e sua degradação moral, ética e social.
Triste fim de um jornal. Meus pêsames a esta "folha seca", que não é o drible de Didi, mas os restos mortais do que já foi um diário matutino respeitável de nossa cidade.
Endosso veementemente o voto de protesto e desprezo à debilidade moral do fato ocorrido. É inaceitável sob qualquer ponto de vista dos bons valores de nosso tempo.
Caros,
Aqui há também a informação de que o Claudio Andrade tb sofre processo movido pelo grupo Folha:
http://urgente.blogspot.com/2009/08/blog-do-roberto-e-o-terceiro-ser.html
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