terça-feira, 29 de abril de 2008

Avyadores do Brazil - Punk, rock, blues e poesia


Divulgando evento de grupo de bambas na Taberna Don Tutti (Rua das Palmeiras próximo da antiga Telerj, também perto da antiga sede do Externato Paulo VI e do Parque Alzira Vargas).

Rock, poesia e subversão nestes dias de convulsão política.

30 de abril - 22 horas - Entrada Franca - Véspera de Feriado.

Pelo que entendi será uma excelente ocasião para debates etílicos e congêneres.

sexta-feira, 25 de abril de 2008

Análise de conjuntura: Uma eleição diferente

Por Vitor Peixoto e Brand Arenari


Dentre o quadro nebuloso e recheado de dúvidas que a próxima eleição municipal nos apresenta, na qual especulamos sem muita clareza quem serão os candidatos, resta apenas uma certeza: será uma eleição bastante diferente das últimas que tivemos. Esta diferença se assenta sobre o papel da máquina pública na disputa eleitoral.

Nas últimas eleições campistas, como o cientista político Renato Barreto nos chamou atenção, a disputa eleitoral era fortemente marcada pelo confronto entre duas máquinas públicas. Por um lado, a Prefeitura e suas toneladas de recursos oriundos dos royalties, que a permitiram arregimentar um mar de cabos eleitorais. No outro canto do ringue, o Governo do Estado do Rio de Janeiro, com não menos disponibilidade de recursos para os mesmos fins.

Se o grupo de Arnaldo Vianna tinha a prefeitura nas mãos, o de Garotinho tinha o governo do Estado, o único aspecto que os diferenciava era a origem dos recursos públicos: um municipal outro estadual. Os meios e os fins eram muito semelhantes.

Nossa hipótese é que muito provavelmente esse quadro não se repetirá nas próximas eleições campistas. Essa hipótese baseia-se nos seguintes argumentos: (a) primeiro, pelo óbvio dado de que o grupo de Garotinho não detém mais o poder sobre o governo do Estado; e (b) o segundo e mais interessante, é o fato de que os últimos dramáticos acontecimentos retiraram a máquina municipal das mãos de qualquer grupo.

Mesmo que o retorno de Alexandre Mocaiber seja mantido até as eleições, grande parte da estrutura que poderia ser utilizada para fins eleitorais já fora desarticulada de forma contundente pela Polícia Federal e danificada parcialmente pelo sucessor RH. Assim, Mocaiber ficaria sem muita margem para manobras, qualquer ação minimamente suspeita seria alardeada aos quadro cantos, além de ter a justiça e a polícia federal em seu encalço.

No caso de Roberto Henriques, o pouco tempo no poder e as incertezas jurídicas lhe retiram bastante a força no que se refere ao controle da máquina para lhe oferecer ganhos altamente significativos neste quesito. Ganhos estes, para ele ou para o grupo que ele venha a apoiar, o que ainda não está totalmente claro.

Some-se a esse quadro a desestabilização das relações espúrias entre os Poderes Executivo e Legislativo. Como se sabe, as ações dos legisladores se pautam, equivocada e exclusivamente, na prestação de serviços que deveriam ser de responsabilidade do Poder Executivo. São os centros de assistências sociais e as ONG’s dos vereadores que lhe garantem retorno eleitoral. Todavia, o Poder Legislativo não dispõe de recursos para tal. Suas manutenções financeiras eram viabilizadas por meio da renúncia de legislar e fiscalizar o executivo em troca de recursos para essas instituições.

Roberto Henriques ao assumir pela primeira vez demonstrou-se pouco interessado em prescindir desse acordo. Entretanto, a ação derrocada do presidente do Poder Legislativo em reempossar Mocaiber peremptoriamente pode constituir em algo inovador na política local. O acordo fora rompido com poucas possibilidades de ser refeito.

Neste quadro, mesmo aqueles que retirarem algum benefício da máquina municipal, seja Mocaiber, Bacellar, Garotinho ou Roberto Henriques, terão benefícios bem menores do que aqueles das últimas disputas.

Esse novo panorama torna a eleição mais equilibrada, abre margem para a participação de grupos que nunca detiveram o apoio de alguma máquina estatal disputar a eleição com mais chances de ganho. Este é mais um dado que nos convence que uma fresta se abre para grupos políticos alternativos aos que tivemos nos últimos anos entrarem no páreo da disputa. Mas resta saber se há grupos alternativos prontos para essa disputa. É preciso mais do que homens de boa vontade.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Termostatos e termômetros

por Renato Barreto


A
s críticas às lideranças que conduzem a política municipal são necessárias e prementes, mas é imperioso também tentar entender a lógica desses indivíduos para que saiamos de uma visão maniqueísta e possamos pensar em soluções capazes de superar o atual quadro. Nesse sentido, as palavras de Cornel West podem ser úteis. Ele é um intelectual respeitado nos EUA e hoje, além de ensinar em Harvard, é um dos principais articulistas da campanha de Barak Obama. Em seu livro Race Matters afirma, referindo-se ao seu país: “... os políticos comportam-se agora menos como termostatos que determinam o clima das opiniões e mais como termômetros que registram o ânimo do público”.

Em Campos, essa tendência assumiu cores dramáticas, os sucessivos mandatos de prefeito foram exercidos perseguindo essa lógica. As ações do executivo são realizadas para produzir impactos capazes de potencializar ganhos eleitorais. As políticas públicas foram amesquinhadas e se transformaram em meras amealhadoras de votos. Planejamento, investimentos estratégicos e ações de longo prazo foram desprezados, não se trata de fazer o que é necessário para superar os graves problemas locais, mas de fazer “o que dá voto”. Quase sempre isso significa atender aos interesses individuais.

E
nquanto a ciência política há décadas debate os fatores determinantes do comportamento eleitoral, em Campos, alguns líderes municipais acreditam que já resolveram esse dilema. Produziram um conjunto de ações destinadas essencialmente a atender sua estratégia eleitoral. O primeiro passo para isso foi estabelecer uma relação espúria com as empresas que prestam serviços para a Prefeitura, afinal, é necessário garantir gordas doações que custeiem as campanhas eleitorais.

O silêncio homologatório da Câmara Municipal foi negociado com cada vereador que pôde tanto estabelecer “convênios” de suas “ONGs” com a Prefeitura, quanto indicar funcionários para postos na administração municipal e ainda obter “repasses” para as “obras” em suas bases eleitorais.

Conquistada a maioria na Câmara, ficou fácil aprovar novos “convênios” com uma enorme quantidade de organizações dos mais variados tipos. Essas entidades não prestam contas de suas ações e os repasses são estipulados sem critérios que levem em conta o interesse público. Via de regra, seus dirigentes mantêm relações pessoais muito próximas com influentes expoentes do governo municipal. E naturalmente se comprometem eleitoralmente até como forma de assegurar a renovação de seus interesses.

No entanto, essas ações não garantiam votos satisfatoriamente. Para potencializar os ganhos eleitorais, ampliou-se o leque dos beneficiados pelas ações do executivo local, por meio da massificação da transferência de recursos que pudessem alcançar o maior número possível de eleitores. Objetivando esse propósito duas ações ganharam especial reforço nos governos de Arnaldo Viana e Alexandre Mocaiber: a distribuição de bolsas de estudos e a contratação de funcionários sem concurso.

É
sabido que o ensino superior não é competência dos municípios. Mas a distribuição de “bolsas de estudo” em faculdades locais se tornou uma verdadeira “febre”. A idéia de a Prefeitura financiar o aperfeiçoamento de seus quadros é uma boa iniciativa, desde que eles estejam matriculados em cursos cujos conhecimentos possam ser empregados na atividade que desenvolvem junto ao poder municipal. Qual é a contribuição que um curso de fisioterapia pode dar a um funcionário que é auxiliar de almoxarifado?
Ademais, a “febre das bolsas” logo serviu para financiar estudos de indivíduos que não trabalhavam na Prefeitura e que obtiveram “bolsas” graças às suas “boas” relações pessoais sem nenhuma contrapartida, nada. O município paga os estudos de cidadão e não recebe nada em troca. A seguir a estratégia se espalhava para escolas particulares de ensino fundamental e médio, numa flagrante privatização do ensino, enquanto as escolas municipais continuam carecendo de recursos essenciais.

Mas a arma mais poderosa de mobilização de votos ficou bem conhecida da população da cidade após a operação “telhado de vidro”. Contratar funcionários sem concursos e criar uma legião de indivíduos dependentes, muitos dos quais convertidos em cabos eleitorais durantes as eleições. O funcionário contratado fica preso a um dilema: se não obtiver votos para o candidato situacionista corre o risco de ser punido com a perda do emprego e, se este não ganhar as eleições, as chances de perder o cargo aumentam.

Todas essas ações foram realizadas a partir de intermediações pessoalizadas sem critérios e obscuramente realizadas. Não são nem direitos dos cidadãos, nem deveres do poder público. Em sua maioria são fundamentalmente meios de rapinar dinheiro dos cofres municipais em favor de interesses particularistas e com fins eleitorais.

É preciso ainda lembrar que não existe corrupção sem corruptores. Desses últimos se fala pouco em Campos, mas são tão responsáveis quanto os corruptos. Naturalmente que as empreiteiras, os conveniados e todas as entidades que obtiveram repasses da Prefeitura se beneficiaram dessas relações e é necessário apurar suas responsabilidades e separar as entidades que realmente prestam serviços necessários e qualificados daquelas que não passam de armadilhas coletoras de votos.

Perseguir a manutenção do poder é típico de quem faz política em qualquer lugar do mundo. Não há nisso nada de condenável, o problema é quando esse propósito passa a ser a única diretriz dos governos. Esse é o caminho mais curto para o enterro dos interesses coletivos e para vicejo dos particularismos mais assanhados.


_____
Renato Barreto Souza é doutorando em Ciência Política no IUPERJ e mestre em Políticas Sociais na UENF.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Carta de Perto....

Carta de Perto[1] – Divagações sobre as últimas movimentações da sociedade civil em Campos dos Goytacazes – RJ

Acompanho interessado os últimos debates destas fontes aparentemente inesgotáveis de análise, os blogs campistas, nestes momentos de profunda e grave crise institucional local. Meu interesse é triplo: sociológico, por conta de sua efervescência; político, por representar a possibilidade do questionamento de condições estruturais de repartição e distribuição do poder; e, por fim, cidadão, por minha estima pelos rumos desta cidade na qual fixo residência e nesta pagar impostos além de desejar, como suponho ser o desejo da maioria, um futuro melhor para Campos por conta de minhas inúmeras memórias sentimentais positivas apesar de tudo.

Há, neste momento, a adesão clara a um movimento, basista, progressista e que se reivindica como horizontal, de questionamento das estruturas de poder. Composto por um estrato que não é representado pela política dominante contemporânea de Campos (profissionais liberais autônomos, pesquisadores, funcionários públicos independentes do poder local, membros de uma classe média radical, produtores e organizadores da cultura, etc.) o movimento reivindica a demanda pela punição dos quadros envolvidos em corrupção que há muito lotearam o poder local. Esta é a reivindicação de curtíssimo prazo representando por uma forma de ação coletiva que visa constranger o judiciário a cumprir seu papel civilizatório no Estado Democrático de Direito punindo todos aqueles que tiveram acesso excepcional e particularista ao erário público, evitando que decisões judiciais atabalhoadas como a última ocorrida na semana passada aconteçam novamente.

Atentando para os comentários e comentaristas presentes nos diferentes blogs representativos deste grupo de manifestantes legítimos vejo uma persistente acusação, por seus detratores, que me soa como interessante e pedagógica para os fins aos quais esta movimentação de parcela da sociedade civil representa. Membros de estratos do poder local, que estiveram de forma ou de outra ocupando este nos últimos 20 anos (?!?), ora acusam a manifestação de ser aparelhada por grupos do Partido dos Trabalhadores local (acusação estranha pois parte do PT tomou parte no governo Mocaiber) ora acusam a manifestação em si como dotada de ausência de conteúdo político. Por ter como palavras de ordem um “FORA” generalizado os atuais agrupamentos que dividem ou almejam retornar ao poder local, ao não ver seus ícones contemplados por esta manifestação, buscam deslegitimar ou cooptar a manifestação e seus atores porque assim atuam há 20 anos.

Eis o ponto em que desejo chegar, algo que já apresentei aos colegas colaboradores deste blog em off. Todos percebemos um vácuo político, ao menos no que entendemos como alternativa consolidada ao poder local, e, conseqüentemente um vácuo de poder propriamente dito nesta manifestação, o “Chega de Palhaçada”, sem dúvidas. Também apreendemos que a manifestação é difusa em seus propósitos carecendo de maior objetivação neste sentido, além da ausência de maior clareza de posicionamento que possa ser identificado sem dificuldades atrelado a uma pauta de reivindicação sistemática.

Asseguro que não estou com os detratores. E este caráter difuso em minha leitura é uma virtude particularmente neste momento histórico. As possíveis falhas não permitem que acusemos o movimento de “apolítico”.

Na verdade considero este movimento singularmente interessante politicamente justamente por apresentar a ausência de referências no poder local tal qual conhecemos. Os atores envolvidos, em número diminuto, ao bradarem um sonoro BASTA materializam a crise e a ausência de legitimidade de um modus operandi que dominou o espaço público local nos últimos anos. E como Arenari já demonstrou com sólidos argumentos esta mudança ocorrida há 20 anos atrás apenas representou a atualização histórica de formas de dominação pretéritas.

Há uma importante fenda histórica aberta neste momento de crise de legitimação das lideranças locais constituídas e esta manifestação é um importante sintoma (mais uma metáfora médica). Inclusive seus representantes intelectuais encontram-se atordoados, atuando nos tradicionais aparelhos privados de hegemonia ou no anárquico universo dos blogs. Acostumados a analisar o mundo como “os conosco e os sem nosco”, buscam deslegitimar este movimento espontâneo pelo simples fato dele não se enquadrar em sua tradicional cartilha de atuação política na planície. O seus intelectuais tradicionais não detém o necessário instrumental analítico para compreender a natureza deste tipo de manifestação. Assim como não entenderam a campanha pelo Voto Nulo em 2004.

Inclusive, algo que demarca de maneira flagrante este manifestação de outras que já vimos ocorrer ultimamente em Campos, creio que não haverá claques pagas ou grupos de classe média cooptados pelo poder local na manifestação, com as já desgastadas e vazias palavras de ordem. Nem fotos em camisas com corações, pedidos de paz, etc..

Em suma, acredito que no substantivo esgotamento de um modelo de fazer política vigente temos duas possibilidades. Em um primeiro cenário grupos não alinhados compreendem a oportunidade histórica e empreendem uma aliança calcada nos valores, mesmo não sistemáticos, que calçam o movimento “Chega de Palhaçada”. Isto significa o o resgate e o término da missão histórica traída pelos próprios grupos do “Muda Campos” de outrora agora encetado por agrupamentos progressistas radicalmente urbanos.

Em um segundo cenário nos resta o cinismo de mais um escopo de candidaturas futuras apoiadas pelos aparelhos tradicionais privados de hegemonia. Aí, lembrando mais uma vez Lênin, será um passo para frente e dois para trás na possibilidade de punição dos grupos envolvidos nos últimos eventos de corrupção. Eis o crime e o castigo já denunciados por Renato Barreto na sua lembrança da literatura de Fiodor Dostoiévski.

George Gomes Coutinho - doutorando em sociologia política UENF

(Texto editado e atualizado em em 23/04/2008 - 23:31 Visando tornar claro alguns pontos obscuros ao leitor)


[1] Trata-se de uma pequena private joke com meus companheiros colaboradores. Em períodos pré-revolucionários no início do século XX, que permitiriam a experiência do socialismo real soviético, V.I. Lênin exilado escreveu suas “Cartas de Longe” sobre a conjuntura russa. No nosso caso, como sou o único dos colaboradores deste blog que ainda encontra-se por aqui em Campos dos Goytacazes fisicamente, mesmo que momentaneamente, chamo esta de “Carta de Perto”.

Na onda do debate sobre comportamento eleitoral

Tecerei aqui brevemente alguns comentários sobre velhas categorias de análise, tão velhas que tem sido até um pouco esquecidas. A isso me refiro à noção de classe social. O que a noção de classe social pode nos ajudar neste debate? Para não ser confundido com o velho sentido que Marx deu a estes termos, usarei o termo estrato social. Denotando desse modo, que quero estar mais sintonizado com as modernas formas de apreensão deste conceito. Mas para falar sobre isso, voltarei a alguns comentários que já fiz sobre os últimos anos da política campista, onde creio que resida uma considerável parte das origens dos atuais acontecimentos.
Na década de 80, em que pela primeira vez forças puramente urbanas entraram na disputa pelo poder municipal, elas estavam divididas em dois segmentos: um mais progressista, representado pelo PT e sustentado, sobretudo, por profissionais deslocados das relações tradicionais de trabalho, no qual o Cefet tinha um papel de destaque; e por outro lado, um segmento que também se valia da crescente urbanização, mas buscava apoio nas massas da periferia urbana “recém” chegada do campo. E esse grupo, liderado por Garotinho foi o que venceu, com uma proposta não progressista como era a do PT, mas com um viés populista e pseudo-progressista. Garotinho não era a oposição ao poder tradicional dos usineiros e proprietários de terra, como muitos pensavam, ele era tão somente a versão modernizada dessa forma de poder, soube arregimentar o ressentimento de uma nova classe social que surgia, a saber, “a periferia urbana”. Ele teve sucesso porque entendeu o momento político mais do que ninguém. Mas quando nós deslocamos a análise das personalidades, outros aspectos, ás vezes até mais importantes, começam a aparecer.
Assim como nos conta Habermas em “mudança estrutural da esfera pública” ou sobre um outro período da modernidade nos fala Klaus Eder em “ a novo política de classes”, as classes médias tiveram papel fundamental no cenário político, foram elas forças modernizantes, não por coincidência foram elas por muito tempo a base de votos do PT. Mas de onde vem está força? Certamente os membros deste estrato social não são por sua natureza mais éticos, ou mais morais ou mais cristãos que os outros, porém a posição que se encontram nesta dinâmica os permitem tomar certas posições poucos comuns. Como já ouvimos mil vezes por aí, política não é um palco onde desfilam anjos, mas sim homens. E a metáfora bíblica nos ensina que nós não herdamos os genes de Abel, mas sim de Caim. O nosso “pai” comum foi aquele que matou seu próprio irmão para satisfazer seus interesses. Por isso, para analisar a política, olhar para a dinâmica dos interesses parece ser bastante razoável.
Aí que a dinâmica de interesse de classe tem algo a nos revelar. A primeira delas é o que mais ouvimos por aí. De forma equivocada as pessoasa colocam a culpa da precarizacao da política nas costas dos setores menos privilegiados. “Menos privilegiados” é o eufemismo que eu uso para me referir à categoria de pessoas que vale menos na escala de valores humanos segundo as avaliações de nossa sociedade (mas isso é papo pra outro debate). Na lógica da política, é mais interessante para essa gente garantir uns tijolos para construir a casa, ou uma “boquinha” para seguir vivendo, do que esperar pacientemente pela “revolução”, e isso é altamente compreensível, por mais que tenha efeitos a longo prazo ruins para todos. Mas como nos lembrou Roberto Moraes em seu blog, não é somente esses estratos que tem interesses materiais no jogo político, há lobistas e empresários de toda ordem que fazem o mesmo jogo, com uma simples diferença, o valor das trocas. Mas em essência, determinados setores empresariais e a “ralé estrutural” (como chama o sociólogo Jessé Souza) estão em pé de igualdade, ambas dependem da política para sobreviver. E quem sobre neste jogo? Justamente aqueles que não dependem da política para sobreviver. Aqueles setores chamados de médios, que normalmente ocupam cargos aos quais não estão dependentes de nenhuma forca pessoal, não tem nomes, são eles apenas números que se perdem na burocracia. Em Campos, como mencionei no meu primeiro post, a antiga escola técnica federal teve um papel fundamental na formação destes setores, nos deu um tipo de gente que rompia com o modelo das tradicionais relações. Mas mesmo assim, foram estes estratos que não dependem da política, pequenos em número, e sobretudo em força, nunca hesitaram em participar como coadjuvantes de quinta categoria no governo daqueles que venceram a primeira batalha, que se apoiavam no populismo.
O que sobre disto é que política só alcança seus objetivos mais nobres quando atores que não dependem diretamente dela ganham espaço no jogo, para essa gente determinados idéias e interesses coletivos não são um empecilho para sua sobrevivência. Devemos pensar também porque em toda nossa história municipal a dicotomia foi sempre entre uma elite tradicional e uma massa de clientes, nunca houve uma classe intermediária que retirasse seu sustento através de relações não pessoais num número e força considerável que pudesse dar outros contornos a história política.
Continua. . .

Aqui também tem São Jorge!


Como hoje aí é dia de São Jorge guerreiro, envio uma foto de um São Jorge berlinense. Até na protestante Berlim ele marca presença. Que São Jorge proteja nossa Campos!

segunda-feira, 21 de abril de 2008

O que você come e em quem você vota


Seguem a charge e o link para o artigo do New York Times sobre hábitos alimentares e comportamento eleitoral. Como disse em comentário ao post anterior, os analistas não utilizam essas informações como explicativas (não chegaram a esse ponto... ainda!), mas apenas como preditoras. Obviamente, são informações importantíssimas utilizadas na comunicação da campanha eleitoral.

What's for Dinner? The Pollster Wants to Know

Homem que calculava e as instituições


Com ácidas discussões acerca de teorias que tentam explicar os fundamentos do comportamento político, a Ciência Política vem construindo, desde a segunda metade do século XX, uma série de instrumentos que visa antecipar como os indivíduos se portam diante de determinados fenômenos sociais. E uma eleição é, por excelência, um desses principais fenômenos.

Também conhecidas por Teoria da Escola de Michigan, as concepções dos psicologistas têm suas origens nas teorias de grupo e na psicologia social. O comportamento político de um indivíduo seria predito pelos ambientes nos quais fora socializado, tendo a família um papel preponderante.

Dessa forma, conhecendo-se as crenças, as opiniões e as articulações sociais, poderíamos identificar como um determinado indivíduo reagiria a certos estímulos. As pesquisas de surveys foram, então, os principais instrumentos analíticos dos adeptos da teoria psicológica do voto. Por meio destes, seriam estabelecidos (ou identificados) os fatores que levariam certos indivíduos a tomarem determinadas atitudes.

O meio social, entendendo este como o conjunto de relações estabelecidas entre os indivíduos (antes mesmo de terem idade para votar), era concebido como o principal formador de opinião. Por conseguinte, grande parte da autonomia da escolha individual fora retirada, pois o indivíduo é quase que exclusivamente o reflexo do seu meio, mas nem todos possuem capacidade reflexiva.

O comportamento político do indivíduo estaria, então, em função das interações sociais. É importante notar que estas interações sociais não significam classes sociais, pois, o que realmente estabelecia a preferência do indivíduo era o sistema de crenças, adquirido em seu processo de socialização, e não exatamente a consciência de classe no sentido marxista do termo. Até porque os indivíduos foram diferenciados em graus de estruturação do sistema de crenças, assim cada um teria uma inclinação diferenciada para o interesse pela política.

Outro fator, não menos importante, seria o grau de centralidade de algumas questões políticas. Esta é uma das questões que, por um lado, estabeleceria uma certa coerência em atitudes de um mesmo indivíduo e, por outro lado, o diferenciava dos demais. Assim, certos temas teriam reações distintas em diferentes indivíduos segundo o grau de centralidade que aquele tema representava para cada qual.

A sofisticação conceitual de cada indivíduo também fora outro método utilizado para conceber diferentes atitudes em relação a certos estímulos, ou seja, quanto maior fosse a sofisticação conceitual de um determinado indivíduo, maior seria a abrangência das questões que teriam um maior grau de centralidade. Em indivíduos com pouca sofisticação política, temas locais seriam os de maior centralidade.

A conjunção entre o sistema de crenças, a sofisticação política e o grau de centralidade forma, para a teoria psicológica, o determinante da orientação do comportamento político do indivíduo. Estabelecendo este determinante, poder-se-ia prever em que partido ou candidato os indivíduos votariam.

Outra inovação formulada foi o continuum “engajamento-alienação”, que seria constituído por um conjunto de quatro percepções que os indivíduos desenvolveriam em maior ou menor grau: impotência política, que se refere ao sentimento de influência sobre as decisões governamentais; ininteligibilidade política, que versa sobre o sentimento de imprevisibilidade das decisões políticas; anomia política, sobre o não cumprimento das regras do jogo pelos atores políticos; e por último, isolamento político, o sentimento de rejeição de normas e objetivos políticos aceitos pela maioria dos membros da sociedade. O primeiro e o terceiro comportamento seriam os mais desestabilizadores dos sistemas, pois, são atitudes que não contribuem para legitimidade do sistema.

A motivação do indivíduo para o comparecimento eleitoral seria, então, a união de três fatores: a identidade político-partidária, o engajamento político e uma série de fatores momentâneos não controlados.

Em contraponto às concepções micro da abordagem psicossociológica, a escola de Columbia, como ficaram conhecidos os representantes da escola sociológica, tentaram focar suas análises sobre os macro-elementos da sociedade. Dessa forma, a escola sociológica assume as coletividades sociais como determinantes das escolhas dos eleitores – daí serem chamados de coletivistas metodológicos. Dito de outra forma: o voto de um indivíduo poderia ser previsto a partir do grupo sociológico em que ele estaria inserido. As clivagens sociológicas preditoras clássicas foram classe, renda, escolaridade, cor/etnia e religião.

Para a escola sociológica, o indivíduo era simplesmente reflexo dessas clivagens. Em outros termos: o que determinava o voto do indivíduo seria a estrutura social. Aqui não há espaço para a ação. Exatamente o que torna essa teoria estéril para explicar qualquer mudança na própria estrutura.

A partir da obra de Anthony Downs [“Uma teoria econômica da democracia”], surgem estudos sobre comportamento político-eleitoral que ficaram conhecidos como teoria da escolha racional. Os adeptos desta escola passaram a analisar o homem político como uma transposição, sem esquizofrenias, do homem econômico. Ou seja, os indivíduos agem politicamente da mesma forma que agem na economia, calculando suas ações de forma a maximizar seus objetivos com os menores custos possíveis.

Em outras palavras, o comportamento do homem político é racional, pois, o indivíduo é capaz de formular um ordenamento de desejos (econômicos), antecipar – como num jogo de xadrez – os custos de cada ação disponível e tomar a opção que mais satisfaça aos seus objetivos, com o menor custo possível.

Por este modelo analítico, conhecendo-se os objetivos podemos traçar quais são as opções mais eficazes e prever o comportamento dos indivíduos que agem racionalmente. Assim, a teoria da escolha racional versa sobre os meios de atingirem determinados fins.

Da mesma forma que os eleitores, os políticos também calculam suas estratégias com o objetivo de obter o maior número de votos possíveis. As políticas são construídas com este objetivo, ou seja, potencializar a maior adesão de eleitores. Então, pela teoria da escolha racional, os políticos antecipam os anseios dos eleitores e formulam projetos que possam acolher o maior apoio eleitoral possível. Observem que para esta concepção não existem eleitores feitos para os partidos, mas partidos construídos para o mercado eleitoral.

Os eleitores distinguem os partidos ou candidatos e decidem em qual votar de acordo com o que Downs chama de renda de utilidade, que é o cálculo de ganhos que cada eleitor espera obter, segundo os projetos de governo de cada partido (utilidade esperada). A diferença entre as rendas de utilidades dos partidos resulta no diferencial partidário, que é o real determinante individual do voto. Caso este diferencial fosse igual a zero, o eleitor teria um motivo racional para se abster. Obviamente, outros fatores entram nesse cálculo, como fatores tendenciais, confiabilidade, responsabilidade, credibilidade dos partidos, etc.

A questão é que essa teoria também não consegue explicar as constituições das rendas de utilidades para além das questões econômicas. A vida não se resume aos ganhos econômicos e a atividade política transcende a questão puramente econômica. Uma série de imbróglios e paradoxos ficou sem respostas.

Assim como também não conseguiram resolver os problemas oriundos dos custos da informação. Surveys comprovaram que a maioria do eleitorado americano agia com desinteresse e desinformação diante dos questionamentos acerca dos temas mais sofisticados da política. Se para executarem escolhas racionais os indivíduos precisam estar informados, e a informação não era uma constante, a própria democracia estaria em jogo, ou a democracia não seria um sistema racional. Estaria assim posto o dilema democrático!

Nenhuma dessas abordagens isoladamente conseguiu produzir algo satisfatório quando aplicado à realidade. Entretanto, novos esforços têm sido efetuados por pesquisadores que não se apegaram ao conflito reducionista do coletivismo-individualismo metodológico.

Surge, a despeito desses pseudoconflitos entre as premissas daquelas escolas, os neo-institucionalistas da escolha racional, que se dedicam às análises das instituições políticas como produto das escolhas políticas e, ao mesmo tempo, como estruturas que influenciam e constrangem as ações individuais. Aqui permanece a premissa comportamental da racionalidade individual, entretanto, os comportamentos são curvas que variam em função dos incentivos institucionais.

Ao dilema democrático respondem por meio da análise de instituições que servem como atalhos informacionais aos cidadãos. Para os neo-institucionalistas da escolha racional, o cidadão não é mais o homem que pela manhã vai ao trabalho, à tarde pesca e à noite participa de uma assembléia. A atividade política foi profissionalizada, a prestação de contas é realizada institucionalmente, não individualmente. Diante de assuntos altamente complexos como a economia, por exemplo, não se exige dos cidadãos conhecimentos minuciosos para que possam tomar decisões. Os partidos e a imprensa são, por exemplo, instituições que atuam no sentido de, a partir do conflito, decantar simplificações que possam ser alvo das decisões.

Voltam-se aos estudos das instituições como prossecutoras e viabilizadoras do sistema democrático. Nem os indivíduos têm retiradas suas autonomias de ações, nem mesmo agem num vazio sem constrangimentos ou ilimitadamente. Após 2320 anos a Ciência Política resolveu aceitar algumas proposições de Aristóteles: as instituições contam!

Não obstante os avanços, alguns sérios problemas permanecem, como as variações comportamentais mantido constante o mesmo sistema institucional. Daí outra dificuldade, quais são as instituições políticas que conseguimos realmente isolar? E pior: temos uma definição clara do que é uma instituição e como elas nascem? Está aí a questão de um milhão de dólares.

“O normal e o patológico”

Por Fabrício Monteiro Neves (Bill)*

Deixe-me usar as metáforas de Brand e Vítor postadas abaixo.
Doenças são objetos de angústia para homens sãos e objetos de estudo para pesquisadores da saúde. O normal é desinteressante para ambos. Para o primeiro, os cuidados só existem na eminência da doença e para os segundos sua profissão só existe em função de tais possibilidades patológicas. Esta unidade na diferença entre “o normal e o patológico” foi magistralmente discutida por Georges Cangilhem em conhecido livro de 1943, cuja conclusão defendia uma antiga concepção médica do século XIX (e filosófica, já que Nietzche a utilizou) em que os fenômenos patológicos eram iguais aos fenômenos normais correspondentes, as variações eram de ordem quantitativa, tudo seria uma questão de intensidade. Bem, intensidade é algo que só existe em relação a alguma coisa e, no caso da vida, dificilmente aquilo que se chama estado normal é algo absoluto, afinal, se está sujeito às variações de temperatura, pressão, escassez de nutrientes, etc... O que se quer dizer é que a definição entre o normal e o patológico corresponde a determinados arbítrios, no caso da medicina, ao consenso científico que esse estabelece no seio da comunidade médica (sujeita aos conflitos de paradigmas divergentes, inclusive). E no caso da política, como a relação entre o normal e o patológico ou entre a crise e a normalidade se estabelece?
Penso em vários fenômenos políticos recentes, que se tornaram “fatos políticos”, “fatos jornalísticos” e “fatos científicos”: Crise política é o “fato” por excelência da política, da mídia e da sociologia, é o “fato” que permite falar de “ordem política”, “receita de bolo” e “ordem social”, já que é o contraste disso, o patológico, que nos permite falar da norma, ou vice-versa. A questão é menos uma questão de descobrir a crise ou de medir sua intensidade quanto de falar daquilo que a criou. Oposições criam crises já que a normalidade é amiga da situação: a medida da patologia construída pela oposição é mais exagerada daquela feita pela situação. A medida dos jornalistas segue o mesmo, porém, neste caso, há outros elementos envolvidos, por exemplo, a ligação de um periódico com o governo correspondente ou sua total discordância, embora se saiba de casos de mudança de opinião em função dos eleitores (leitores). É Claro que a situação também cria crises: colocar a polícia federal a serviço delas é uma boa forma... Crises e estados patológicos ligam-se ao seu tempo, no segundo caso ao estado da ciência no momento do diagnóstico e, no primeiro, ao estado das forças políticas, do embate entre elas. Podem-se criar crises com uma tapioca, assim como não criá-las com consumo exagerado de caviar ou transações nebulosas nas vendas de estatais.
No caso da medicina, o restabelecimento do estado normal segue aquilo que é definido como normal em contraste com o patológico, definição relacionada ao estado da arte da disciplina naquele momento: a determinados padrões de temperatura e pressão, formação tecidual, etc.. No caso da política não é tão simples. É possível que os padrões do momento da crise continuem os mesmos e a crise acabe, por exemplo, pela cooptação da oposição... É possível também que tudo mude, melhorando inclusive em relação à ordem anterior, e que a crise continue já que para a oposição isso é vantajoso e para o editor de tablóides, lucrativo. Criar crises, aumentar ou diminuir sua intensidade, está em razão da maneira como se constituiu, nas sociedades modernas, o mercado político e jornalístico: a crise, assim como a patologia, como nos mostra Cangilhem, não apresenta uma dimensão ontológica, sendo tão somente construções sociais.
Isso nos dá uma responsabilidade absurda já que não há uma realidade fora de nossas escolhas: elas são o ponto arquimédico da existência ou não da crise, em qualquer mercado. Escolhas porém se assentam sobre princípios e fins. Pode ser que aquilo que nos leva a escolher seja tão somente vender mais jornais, ou aniquilar a oposição, ou conseguir um emprego, ou, ainda, mudar o mundo (e isso às vezes não é antagônico). O Le Monde vendeu muito em maio de 68... Como um estado patológico, o estado de crise pode ser um estado de transformações generalizadas.
*Fabrício Monteiro Neves é sociólogo, graduado na UENF, e doutorando em sociologia na Universidade federal do Rio Grande do Sul

domingo, 20 de abril de 2008

Entre lepras e tumores

Momentos críticos como se presencia em Campos tendem a nos atrair para as particularidades. O inusitado, o extraordinário. Entretanto, há a necessidade de se direcionar nossas análises para outros campos que não somente a cidade. Obviamente, Campos possui suas especificidades, aquilo que a faz ser Campos e não qualquer outro município. Mas essas características não possuem a capacidade de explicar tudo. Pois, Campos compartilha outros fatores que não são exclusivos.

A começar pelas mudanças institucionais pelas quais passam todos os municípios brasileiros, em maior ou menor grau. Em outro texto publicado aqui nesse espaço chamei a atenção para a ampliação dos mecanismos de controles democráticos. Seja pela interiorização das instituições, ou mesmo pelo avanço da tecnologia à disposição dos responsáveis pelo controle.

Semanas atrás outros 17 municípios, principalmente, do Estado de Minas Gerais também passaram pelo mesmo tratamento. A Polícia Federal privou a liberdade de dúzias de prefeitos, secretários e empresários que se especializaram no desvio dos recursos oriundos do Fundo de Participação Municipal. E mais: os detidos cobrem quase todo o espectro partidário (Dem, 5; PTB, PR, PSDB, PT, 2 cada; PDT, PSC e PTdoB com um cada).

O que estamos chamando de crise pode ser apenas um espasmo. A hanseníase que Arenari expôs pode ser apenas uma queda de cabelo (ou de prefeitos, como preferirem) provocada pela quimioterapia institucional. Faz parte do tratamento contra câncer que é o desvio de dinheiro público. Mas não configura uma crise. Crise mesmo esses municípios já viviam, mas era silenciosa, como um tumor que se alastra vagarosamente pelo paciente. O fato de ter dado publicidade não configura a crise, mas apenas seu reconhecimento.

Repito: o Brasil está em processo de mudança e amadurecimento institucional. Observaremos por um longo tempo casos como o de Campos. E posso dizer com clareza que hoje estamos melhores do que ontem!

Vitor Peixoto

O editorial da "Folha". . .



Hoje no Blog “a trolha” Xacal apresentou um texto no qual se propõe dissecar o editorial do jornal “folha da manha” deste domingo. Xacal o faz muito bem, e de maneira bem divertida. Pegando carona na empreitada do Xacal, tecerei eu aqui alguns comentários complementares.
Acredito que dois aspectos se destacam no editorial da “Folha”. O primeiro deles é a clara tentativa de deslocar a imagem de Mocaiber de tudo o que aconteceu na prefeitura de Campos dos Goytacazes. Tentam nos passar a imagem de que ele foi vítima, ou quase um refém nas mãos de auxiliares corruptos. E logo, vende-se o peixe que a troca destes auxiliares resolveria o problema, do qual Mocaiber pouco teria responsabilidade. Creio que estamos um pouco acostumados com essa estratégia, assim os defensores de Lula fizeram. Queriam que acreditássemos que Lula não sabia do que faziam seus assistentes diretos, que ele era um homem simples e de bom coração enganado por espertos corruptos. De certa forma vimos isso com a imagem do ex-prefeito Arnaldo Viana, quem nunca ouviu em Campos que a suposta corrupção do governo de Arnaldo era culpa de sua esposa e não dele, que também era visto com um homem de bom coração etc..
No entanto, o segundo aspecto que ponho em destaque, creio ser mais prejudicial que o primeiro, muito embora não estão eles totalmente deslocados um do outro, até se complementam. O segundo aspecto que ponho em destaque é propagação da idéia presente no editorial da “folha”, que nos conduz a acreditar que podemos apagar tudo, ou melhor, esquecer tudo e começar um novo governo de Mocaiber. Existe aí a tentativa, ou a crença (se julgarmos que tem boas intenções), que podemos tirar o conteúdo histórico de tudo o que se passou, e partir agora do zero. Logo esvaziando qualquer possibilidade mais profunda de debate que nos leve uma compreensão melhor do que se passa em Campos dos Goytacazes.
Nesta lógica, somos conduzidos a pensar a realidade de forma fragmentada, acreditando que os fatos se dão a partir do acaso e não detêm nenhuma história ou razão de ser. Assim, pensamos que os problemas que nos assolam dizem respeito somente a eventos isolados ou a má sorte de um homem de poucos escrúpulos nos governar. E então, respondemos ingenuamente que para solucionar isso é preciso apenas trocar os homens que estão no poder. Trocar homens imorais por homens morais. (No caso do Editorial da “Folha” isso é pior, porque crê que o mesmo homem que agiu de forma incorreta pode voltar e de repente agir de forma correta, não se dão o trabalho de ao menos trocar os homens). E aí reduzimos a questão da política à moral, e perdemos a oportunidade de entender o que se passa conosco.
O que o editorial da folha não nos deixa ver é que a crise política de Campos dos Goytacazes, creio já ter dito isso antes, não é obra do acaso ou de fatos isolados, não é algo passageiro e ocasional. É ela uma crise endêmica, sistêmica. Não diz respeito a homens isolados, e as formas de conduta destes, mas sim diz respeito a toda uma sociedade. Precisamos saber que a doença que nos acomete é o “mal de Hansen”(antigamente chamado de lepra), e não se trata desse mal colocando Band-aid e mercúrio cromo em suas feridas.
por Brand Arenari

sábado, 19 de abril de 2008

Enfrentando a crise

Como todos nós sabemos uma crise não é algo que surge do acaso, ou mesmo de repente, é sempre o resultado de um processo que vem se desenvolvendo há tempos. E quando essas crises se tornam recorrentes, como é o caso de Campos dos Goytacazes, é o sinal de que algo vai muito mal, há muito tempo, e nos seus primeiros sintomas não foi lhe dado a devida atenção. Para resolver processos como estes é preciso mais que voluntarismo e boas intenções, é preciso primeiro entender o que está acontecendo. E o texto do Xacal intitulado “breve história política de Campos do G. e suas elites. . .” publicado no seu blog “A trolha” , é um convite para isso. Recomendamos a leitura. http://atrolha.blogspot.com/2008/04/breve-histria-poltica-de-campos-dos-g-e.html

Chineses protestam em Berlim contra o boicote das Olimpíadas


Os chineses foram ás ruas hoje em Berlim para protestar contra o boicote as olimpíadas na China. Dentre muitas bandeiras da China e da Alemanha, muitos cartazes que diziam que o boicote as olimpíadas era algo como o muro de Berlim, e atacavam também a suposta parcialidade da imprensa ocidental, acusando esta de divulgar somente a visão do Tibete. Sorte dos chineses que a Alemanha é um país democrático, que permite manifestações deste porte, nas quais conta com apoio da polícia para evitar qualquer problema. Gostaria de saber se eles poderiam fazer o mesmo no país deles. Talvez lá, a polícia também estaria presente, mas para cumprir outros fins.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Sobre royalties e razão pública – o que é fazer da sociologia um esporte de combate? - Parte Final

A chamada razão pública, em uma inspiração kantiana e re-visitada por diferentes tradições liberais contemporâneas[1], não é pertinente a um suposto mundo irreal e transcendente composto igualmente por humanos não existentes. Razão pública é aquilo que se manifesta no momento de debates acerca de bens essenciais em que, por motivações intrínsecas, exige para a sua legitimidade o filtro de debate público. É um princípio perfeitamente pragmático não transcendental e pode ser reivindicado diante da defesa de algo que podemos compreender como “bem comum”.

Prosseguindo, neste(s) debate(s) publico(s), mediante procedimentos discursivos assegurados constitucionalmente e defendidos pela coletividade, em que grupos de pressão vigiam uns aos outros e abertamente competem entre si, temos um desfecho simples de ser compreendido: o triunfo do melhor argumento, ou ao menos o triunfo de algum tipo de convencimento consensuado obviamente entre as partes. Não há acordo se as partes não consentem sobre este, base sob a qual constitui-se a razão pública.

Notório é que estes procedimentos nem sempre resultam nos melhores resultados, não há aparato perfeito. Mesmo o “gigante”[2] de Königsberg, Immanuel Kant, asseverava que “de madeiro tão torto que é o homem nada de muito reto pode se esperar dele”. A grande questão, que me interessa para fins deste pequeno ensaio, é que se aplicarmos especificamente a premissa da “razão pública” sem peias aos agrupamentos sociais que até então “dominaram a caneta” ou que “dominam a caneta” estes encontram-se sob péssimos lençóis.

Vamos aos fatos. Pela explicação resumida por Roberto Moraes em seu blog, os royalties devem ser compreendidos como um bem compensatório visando amortizar, dado que por motivações eminentes a atividade produtiva petrolífera em si deixa seqüelas sob a forma de profundos impactos sociais e ambientais. Incluso que há também os problemas econômicos dado que o petróleo, por conta de sua vultuosa quantidade de riqueza, atinge em cheio a cadeia produtiva local gerando, por conta deste volume de dinheiro, aumento substantivo do preço de bens e serviços. Ainda há a questão geracional, daí este caráter compensatório, dado que a economia do petróleo fundamenta-se em um bem escasso que em algumas décadas irá findar.

Todavia a utilização dos royalties não observou aplicações substantivas no campo social, ambiental, econômico e social. Quando o fez foi exíguo. Irei citar dois exemplos que sem dúvida são insuficientes para avaliar uma lei como um todo, a de distribuição de royalties, mas, ainda podem ser exemplos ilustrativos para o esclarecimento desta questão. No ano de 2007, em Campos dos Goytacazes, a educação fundamental obteve, segundo ranking proposto pelo Ministério da Educação (MEC), a nota de 2,9. Esta nota fez com que a cidade figure como a dotada do pior ensino fundamental no estado do RJ. Isto já resume bem o problema “geracional” e não trata-se aqui de uma posição esculpida apenas pelo último governo. Profissionais estudiosos especificamente de políticas educacionais afirmam que resultados nesta área apresentam modificações apenas no médio prazo, algo que só aumenta a responsabilidade de gestores anteriores.

Um outro dado interessante é no campo da logística e também no da qualidade de vida. Irei me utilizar de uma análise que é transversal mas que nos ajuda a entender o tamanho do problema. Campos dos Goytacazes, segundo análises do Movimento Nacional de Direitos Humanos (RHDH), é proporcionalmente a terceira colocada no ranking de trânsito mais violento do Brasil (dados disponíveis mais uma vez no blog de Roberto Moraes aqui). Possivelmente para o imbróglio “trânsito”, caótico e que aumenta tempo de deslocamento da força de trabalho além de inúmeras dificuldades envolvidas neste deslocamento, não foram exatamente dissolvidas pela aplicação de royalties.

Tudo isto a despeito da proporção crescente inegável ocorrida na participação dos royalties nos orçamentos municipais, exemplo quase paradigmático sendo o de Campos dos Goytacazes, onde tivemos os dados negativos anteriores além da conseqüente desastrosa política anti-epidêmica (?!?) no surto de dengue ainda vivido que não comentarei neste post. Também não irei citar a posição de número 1808 (?!?) no Atlas de Desenvolvimento Humano do Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD) referente ao já longínquo ano de 2000.

Retomando o debate ilustrado pelo conceito complexo de razão pública. O petróleo é um bem essencial para as economias capitalistas e é sob a imagem e semelhança deste que o modo de produção hoje se movimenta, se alimenta e se autocompreende. Sob este, e em sua nefasta utilização, há debates sendo desenvolvidos no espaço público onde ambientalistas ou não alertam acerca do aprofundamento de uma série de desequilíbrios macro decorrentes da utilização de combustíveis fósseis. Portanto qualquer tipo de receita que retorne para o público que o produziu, cientes que somos das profundas cicatrizes deste processo, devem ser pensadas para além de debates ossificados no campo do direito positivo, onde vemos bradar “que se cumpra a lei” se esta já não cumpre faticamente quaisquer critérios de uma racionalidade substantiva.

Também sustento que critérios “técnicos” são insuficientes para determinamos a forma com que os royalties devem ou não ser repartidos. Qualquer tipo de repartição geográfica é em última instância decorrente de convenções e anexas a determinados paradigmas que são, antes, socialmente construídos. A questão geográfica deve ser parâmetro inicial. Todavia falta um elemento a este pois ele define onde principia o direito apenas.

O argumento particularista/bairrista é o “pior dos mundos” pois ele simplesmente nega ao outro acesso a bens e recursos que também poderiam ser essenciais para o seu desenvolvimento. É essencialista, pré-reflexivo e pré-político pois crê que não necessita de justificação para sua reivindicação. Ainda, no caso de todos os argumentos e advertências encetados pelo poder local, que em última instância objetivaram a “razão pública” na arena campista, o argumento bairrista desaba fragilmente sobre si mesmo pois não se sustenta.

Se formos utilizar qualquer princípio de “bem comum” atinente à razão pública devemos dizer que estes recursos passaram a quilômetros. Retomando, os estudos e análises já produzidos pela inteligência local são duros e não mentem. Portanto, pelo “bem comum” não há porque estes recursos, ressaltando sua escassez, por aqui continuarem ingressando impunemente sem que de fato tenhamos critérios de eficiência de aplicação.

Uma proposição. Reconhecendo, mais uma vez, que não há arranjo perfeito, eu diria que no espírito de um “bem comum” eu apoiara, como cidadão, a proposta do senador federal João Pedro (PT- AM) que defende a aplicação deste recurso compensatório exclusivamente na educação. Cabe lembrar que no Brasil temos uma das mais baixas taxas de jovens, em idade estudantil, freqüentando as universidades se compararmos somente com a América Latina. Se os royalties participassem deste processo, gerando mão de obra qualificada e estofo crítico, minha reivindicação de “razão pública” neste breve esforço de análise sociológica fundidos com determinados princípios de filosofia política já se daria por satisfeita.

Por fim devemos nos livrar terminantemente dos argumentos de impacto sobre a economia local no curto prazo para o bem desta. Reitero que uma economia local “consolidada” sob pés de barro é uma monstruosidade para com a população anexa. Para a economia local devem-se buscar soluções realmente sólidas e não remendos, a despeito do tamanho destes, como os royalties prosseguem sendo.

George Gomes Coutinho – sociólogo e doutorando em sociologia política pela UENF



[1] Refiro-me aqui especificamente a definição proposta por John Rawls em “O liberalismo político” lançado no Brasil em 2000 e originalmente nos EUA em 1993.

[2] As más línguas dizem que sua estatura física era, em verdade, baixa. Portanto “gigante” aqui é uma figura de linguagem.

Financiamento de campanhas: entre oximoros e Hidras de Lernas

Difícil imaginar qual(is) ponto(s) da tão falada reforma eleitoral seria(m) o(s) principal(is). São tantas questões e tantos pretensos protagonistas, que o debate se perde em um emaranhado de falsos dilemas, e pior: comandado por pseudo “especialistas”. Ao menos um aspecto parece ser comum entre os “entendedoristas” de plantão: o posicionamento de ser “contra tudo que aí está”. Sob um sistema de causalidade ininteligível, surgiram propostas das mais variadas estirpes, às vezes mais de uma pelo mesmo deputado. Desnecessário seria dizer que o resultado desta confusão não corre o mínimo risco de dar certo.

Para restringir esta análise somente ao sistema de financiamento de campanhas, despontou uma proposta digna de nota, qual seja, um mix de financiamento público e privado, em que as campanhas para os cargos proporcionais seriam financiadas exclusivamente pelo último (por pessoas físicas e jurídicas), enquanto que as campanhas para os cargos majoritários seriam financiadas somente pelo primeiro (público). O que os grandes “engenheiros institucionais” se esqueceram (será esquecimento?) é o fato de que as distintas campanhas acontecem no mesmo período e, obviamente, se auto-influenciam – quem duvidar que correlacione a proporção de votação em legenda dos partidos com seus resultados para os cargos majoritários das últimas eleições nacionais.

Os efeitos perversos ocasionados por este sistema seriam vários, mas vale destacar a presumível utilização das campanhas proporcionais para arrecadar fundos destinados aos cargos majoritários – sendo que os partidos já teriam recebido os recursos dos contribuintes para esta finalidade por meio de financiamento público. Mesmo que estivéssemos a tratar de candidaturas de anjos franciscanos, esta transferência seria inevitável, pois, a lei eleitoral obriga que os candidatos aos cargos proporcionais se refiram em suas propagandas aos candidatos aos cargos majoritários.

Trocando em miúdos: as campanhas eleitorais continuariam sendo “patrocinadas” por financiadores privados direta ou indiretamente, e teriam um aporte do Estado ainda maior do que hoje já existe. Exemplo clássico é a transferência de recursos indiretos através do horário eleitoral, que só é gratuito para os partidos. Pode ser defender como justo, pois faz parte do custo da democracia e visa garantir a mínima competitividade do sistema partidário. Mas não é gratuito. O contribuinte paga.

Dentre os 111 países que analisei em dissertação defendida no IUPERJ em 2004 (“Votos valem quanto pesam? O impacto do Financiamento de campanhas eleitorais no Brasil”), o Brasil é um dos países que mais impõem restrições regulatórias sobre as fontes de financiamento privado.

Em 39 países, sequer existe um sistema organizado de regulação das campanhas eleitorais. No Brasil, tanto os partidos quanto os doadores são obrigados, pela legislação, a declarar movimentações financeiras de cunho eleitoral. Há proibições para doações oriundas de sindicados (trabalhadores e patronais), empresas estrangeiras, concessionárias de serviços públicos etc. Enfim, há um sistema e há um órgão do judiciário responsável pela regulação (TSE e TRE's).

A simples obrigação dos partidos em prestar contas é observável em apenas pouco mais da metade dos casos (59 países). Entretanto, em 42 deles, a responsabilidade de dar informações é, exclusivamente, dos partidos políticos. Isso para não citar os países que sequer proíbem doações anônimas (apontadas pelos analistas como as fontes de financiamento de narcotraficantes em muitos países latinos). São não menos que 63 casos que permitem doações sem que seja declarado o doador, e o Brasil está fora destes.

Destarte, não serão por meio de regras ainda mais proibitivas que se resolverão os problemas de intervenção dos grupos organizados na política, muito menos os casos de corrupção. Proibir sem fiscalizar só é válido para atividades religiosas. O Papa, o Bispo, o Reverendo, o Pai de Santo, o Rabino e demais líderes religiosos podem pedir ética e moral. Ao Estado cabe fazer cumprir as leis (Law enforcement). Seja criando mecanismos que diminuam a probabilidade de impunidade, seja aumentando os custos da punição. Em não se tratando de anjos, nada valerá impor ainda mais regras proibitivas e não assegurar que elas sejam efetivamente aplicadas aos transgressores.

O que não significa afirmar que o sistema atual é o melhor possível. Há sim necessidade de se corrigir equívocos regulatórios do sistema de financiamento em vigência, que utiliza tanto fontes públicas (direta ou indiretamente) quanto privadas para ambos os cargos.

Entretanto, por que não propuseram a fixação absoluta dos limites aos doadores e aos partidos? Hoje os limites aos doadores privados são relativos ao faturamento auferido no ano anterior (2% e 10% para pessoas jurídicas e físicas, respectivamente). Por que não estabelecer um limite absoluto único, em que cada um pudesse doar até aquele patamar? E mais, e pior: os limites impostos arrecadadores são determinados por si próprios no início da campanha. Por que não impor aos partidos um limite único para cada campanha?

Outro ponto é a prestação ser realizada somente após as eleições, o que se constitui em um obstáculo tanto à informação dos eleitores, quanto ao eficaz controle do próprio TSE. Caso uma conta de campanha seja rejeitada, pode causar danos irreparáveis aos cálculos de cadeiras num sistema eleitoral proporcional. Pode-se até cassar o mandato de um candidato, mas os efeitos para a distribuição proporcional já foram ocasionados. Se um candidato é cassado, quem assume é o seu suplente pertencente ao partido (ou à coligação). Mas o partido que foi beneficiado pelo desvio de conduta daquele candidato não perde aquela cadeira. Em alguns casos, se fossem refeitos os cálculos de distribuição como proponho, o partido poderia até mesmo ficar sem cadeira alguma! Em realidade isso transformaria o partido em co-responsável na prática, com punições que não se resumiriam ao pagamento de multas.

Por que não obrigar, então, os partidos e candidatos a declararem suas receitas e despesas durante as campanhas? Seria uma importante informação que estaria à disposição do eleitor para que este saiba quem está a financiar o seu candidato. Tecnicamente, seria mais um atalho informacional à disposição da accountability (que chamo de proto-prospectivo, pois se refere às futuras perspectivas do candidato). Antes das eleições há possibilidade do eleitor mudar seu voto, depois de apertada a tecla verde terá de esperar quatro anos!

Parece que se tornou moda ser reformista, mesmo que em prejuízo das regras da causalidade, propõe-se de tudo um pouco sem se ter a mínima noção das possíveis conseqüências. Surgem propostas para todos os gostos e por todos os lados, como se o sistema eleitoral fosse uma Hidra de Lerna que precisasse ser abatida a todo o custo, nem que para isso fosse necessário entregar nosso destino ao primeiro Hércules que aparecer. Ainda há até os que justificam o financiamento exclusivamente público como forma de proibir caixa dois... Ora, oximoro maior não deve haver! Receio que estes “sabidões”, um dia, enveredem-se nos estudos de violência urbana. Provavelmente, proporão uma lei que proíba assassinatos.

Eleições, imprensa e a miopia

A imprensa brasileira importou o modelo americano de como construir formalmente seus textos jornalísticos. São frases curtas, vocabulário restrito e com sujeito, verbo e predicado, necessariamente nessa ordem. Mas parou por aqui.

Diferentemente do modelo francês, geralmente, os textos da imprensa brasileira prescindem de um conteúdo analítico mais acurado. Mesmo os espaços para opiniões são curtos no tamanho e rasos na profundidade. Não que isso represente uma imparcialidade. Como sempre, repete um amigo do jornal “O Globo”: "na redação somos majoritariamente petistas ou simpatizantes da esquerda, mas isso não importa, não somos nós quem define a pauta!". Os repórteres podem ser o que eles quiserem, mas quem define a linha do jornal não vai para a rua, manda quem vai, para onde vai e para o que vai. Isso é no Brasil, isso é no mundo.

O problema, como sempre digo, não é a imparcialidade. Isso é inexorável, é do ser humano. O que causa danos a uma comunicação de qualidade é a pretensa parcialidade que tentam nos vender a todo custo, como se não fôssemos dotados de capacidades reflexivas.

Tenho acompanhado a cobertura das eleições primárias pelos principais jornais americanos. Os ataques aos candidatos são diários, intensos e contundentes. Os temas mais delicados são arremessados para os candidatos com a velocidade de uma bola de baseball. E como no jogo, ganha quem rebate e perde quem deixa passar.

A cada rodada de debates (foram vários até aqui, seja entre os próprios candidatos, seja entre os candidatos e as comunidades), os pretendentes ao cargo máximo da nação americana precisam demonstrar conhecimento sobre temas diversos e habilidade nos discursos. Esses debates são tão importantes que, mesmo com a desistência de todos os oponentes republicanos, John McCain continua freqüentando.

No dia 25 de janeiro, o “The New York Times” publicou dois editoriais intitulados "Primary Choice: Hillary Clinton" e "Primary Choice: John MacCain". Era o início da campanha pelas primárias e o jornal já havia feito as suas duas escolhas, uma para o partido Democrata, outra para o Republicano. Notavelmente, Hillary é a preferida, e o jornal não esconde isso.

O editorial sobre o Republicano foi aberto com a seguinte passagem: "Nós discordamos de todos os pré-candidatos Republicanos". E o segundo parágrafo complementa: "Todavia, uma escolha tem de ser feita. E não é uma escolha fácil." A partir de então, são elencados os predicados (em grande maioria, extremamente negativos), como justificativa para preteri-los.
Com essa postura, o jornal deixou claro ao seu leitor a opinião do corpo editorial. Dos que mandam no jornal. Dos que aprovam a pauta do dia. Dos que escolhem quais jornalistas irão escrever sobre o quê. Dos que dizem: publique ou não!

Em outras palavras, o jornal optou pela franqueza com seus leitores. E isso não significa que são mais honestos, dotados de compromisso moral e ético, ou qualquer coisa que o valha. Essa é uma postura dos que não tem braços curtos, dos que enxergam dois palmos além do nariz. Sabem que os (e)leitores, mesmo sem os editorais, identificariam as opções do jornal. O que distingue e a forma como iriam identificar, ou pelo próprio jornal por meio do editorial, ou ao longo do tempo, por meio do conteúdo do jornal. Ao poupar os custos dos (e)leitores, pouparam sua própria credibilidade.

No Brasil, apenas o jornal “Estado de São Paulo” e a revista “Carta Capital” utilizam dessa franqueza com seus (e)leitores. Um jornal tipicamente conservador que apóia o PSDB, e uma revista progressista de centro-esquerda (seja lá o que isso significa) que apóia o PT.

Importou-se somente o que a imprensa americana tem de pior, conteúdo ralo e textos curtos. Bem a imagem da capacidade intelectual dos que escrevem. Melhor seria ser filho da outra.

Crise: Por que a cana não amarga?

Por Fabrício Monteiro Neves (Bill)*

Vejo de longe e pela movimentação do blog que há uma crise político-institucional em Campos. Quando aí estive pesquisei um pouco sobre a história da indústria da cana-de-açúcar na planície e soube, por Gilberto Freyre, que tal cultura aí se manifestou de maneira diferente daquela do resto do país, especialmente da de Pernambuco. Em Campos há uma grande planície e um grande rio e já se sabe há muito, uma grande bacia de petróleo... Estas características implicam formas de organização social variadas, mas em Campos elas acomodaram as possibilidades históricas sob limitadas formas políticas e econômicas. Lembro-me de muitos acontecimentos que podem significar acomodação. A indústria canavieira campista foi uma das últimas a substituírem arcaicas geringonças por maquinário moderno, já usados em outras partes do país, o que fez com que perdesse competitividade em diversos momentos da história. Tal indústria também se favoreceu sobremaneira de condições políticas federais, manifestadas nos programas pró ou contra a indústria canavieira, estando à mercê sempre de incentivos governamentais e perdão de dívidas, muitas vezes contraídas pela falta de austeridade e pela manutenção sempre dispendiosa de uma vida aristocrática dada ao esbanjamento (soube de diversas viagens à Europa e festas grandiosas nos períodos de bonança). O uso do trabalho escravo parece também ser uma chaga que perpassa o tempo e mostra uma afinidade com tal cultura. Ainda hoje é denunciada esta modalidade de exploração bárbara da força de trabalho, que inclui crianças com jornadas de trabalho comparáveis a do século XVIII. Até a Igreja Católica campista se acomodou, quando permaneceu estática em relação às reformas levadas a cabo pelo papa João XXIII na década de 50. E agora a indústria do petróleo... como se não bastasse a acomodação em torno de um grande rio, em torno de uma cultura canavieira estática, em torno de formas fáceis de produção... Enfim, formas que criam toda uma atmosfera contrária ao empreendimento e à iniciativa individual, alicerces da democracia moderna. Hordas inteiras refém de aristocracias políticas e ao sabor do que vem de cima. Uma “sociedade civil” letárgica e incapaz de escapar às migalhas, com pequenas chances esporádicas, que aparecem quando estas formas se afrouxam: foi assim na crise dos financiamentos à cana. Parece o pesadelo político elevado à enésima potência, manifesto em uma forma simples: muito dinheiro + muito estado = acomodação.

* Fabrício Monteiro Neves é sociólogo, graduado na UENF, e doutorando em sociologia na Universisade federal do Rio Grande do Sul

O que a experiência do PT no poder pode nos ensinar sobre nossa crise municipal

Vários aspectos da experiência do PT no poder têm muito a contribuir para o amadurecimento da nossa compreensão da política nacional, a começar pela inédita experiência de um partido de esquerda no poder. No entanto, dentre esses vários aspectos, um se destaca para este nosso debate, tanto pelo potencial de aprendizado que ele representa para o Brasil como um todo, quanto pela estreita relação que guarda com a nossa crise municipal. E o aspecto ao qual me refiro, infelizmente, diz respeito aos escândalos de corrupção.

Antes de adentrar nos pontos que julgo serem os cruciais deste tema, gostaria de pontuar que corrupção não é algo simples de se descrever, há “corrupções” e “corrupções”, prometo que escreverei sobre este tema posteriormente. Porém não me aterei a isso neste “post”, dedicar-me-ei aqui ao que há de central neste tema, o papel da moral na política.

Durante sua trajetória, não é novidade para ninguém que uma das principais bandeiras do PT foi à bandeira ética. O PT sempre anunciou aos quatro cantos do mundo sua superioridade moral em relação aos outros partidos. Mesmo com os escândalos de corrupção no governo federal eu não duvido que o PT talvez seja realmente o partido menos corrupto do Brasil, porém não é isso que importa aqui, o que importa é o atraso político que ocorre quando as discussões políticas giram apenas entorno do tema da moral. E quanto a isso, o PT tem uma grande parcela de culpa. Por muito tempo, o principal argumento da oposição petista foi contra a corrupção. Acreditava, ou alardeava, que a corrupção era faceta do capitalismo (o que a história nos mostra que estavam equivocados), e depois que a dicotomia socialismo-capitalismo perdeu força, a direta passou a ser para o PT a depositária natural da corrupção. Assim, ao invés de se discutir um projeto alternativo para o país, o PT acreditava, ou alardeava, que o simples fim da corrupção, que se daria com a chegada do PT no poder, faria o Brasil deslanchar de vez, não só como uma boa economia, como também um país mais justo. Enfim, a moral, se não era o principal programa de governo do PT, era ao menos o mais propagandeado.

No entanto, o PT chegou ao poder e esse sonho dourado ruiu. Essa chegada funcionou para o PT e para todos aqueles que acompanharam no papel de observadores entusiasmados sua trajetória, (e eu me incluo aí), como um rito de passagem. Era a hora de sair da infância e entrar no mundo adulto. E o primeiro desafio quanto a isso, era ter maturidade para encarar a dura realidade que para governar um país como o Brasil é preciso mais que boa vontade e um coração imaculado. E o segundo desafio, tão duro ou mais que o primeiro, era olhar pra si mesmo e perceber que não se tinha o coração, nem mesmo de longe, tão imaculado assim.

O PT parece ao menos em parte ter aprendido a lição, mesmo sem ser um exemplo de honestidade, um exemplo de ética e moral, faz um dos melhores governos que já tivemos, que consegue estabelecer melhorias no nosso maior mal, muito pior que a corrupção, a saber, a desigualdade social, além de não ir mal na economia. Isso causa para nós, homens comuns que não vivem dentro da política, um desconforto terrível. Somos obrigados a refletir que o mundo da política parece ser diferente daquele em que nós vivemos no nosso cotidiano, as regras que valem para o nosso mundo funcionam diferente na política. Os conselhos da vovó e da catequese que aprendemos com aquele padre velhinho e bonzinho, mesmo que sejam importantes para o nosso dia-a-dia, não são tão fundamentais assim para o mundo da política.

Precisamos apreender com a experiência do PT que não é apenas com corações imaculados que faremos uma boa política, até porque esses são difíceis de se encontrar por aí (os escândalos de corrupção do PT provaram isso), quando menos esperamos vemos que até mesmo nossos corações não são tão puros. Na Alemanha, país que muitos gostam de tomar como exemplo, o grande herói da reunificação, o político e ex-chanceler Helmut Kohl, foi pego com problemas referentes a verbas de campanha. No mês passado, a reitora de uma das grandes universidades de Berlim foi acusada de comprar um apartamento de 60.000 € com verba pública. Com isso, podemos ver que corrupção não é um “privilégio” só nosso, bem diferente de uma brutal desigualdade social, diferente de um capitalismo que se desenvolveu numa sociedade escravocrata (e quanto a isso Campos está no olho do furacão), que são problemas só nossos. Por que então só falar de corrupção?

Despender a maior parte do tempo com lamúrias morais, ou acusações e denuncismos, não é apenas a forma com que nossos líderes políticos locais ou nacionais escondem sua mediocridade, mas é também a forma com que nós, que nos propomos ser críticos, demonstramos a nossa incapacidade de tecer análises mais acuradas e pontuais a respeito de nossos maiores problemas. Assim como todos, eu também gostaria que os nossos políticos fossem menos corruptos, mas penso que um mal pior do que a corrupção pode nos fazer, não são as tragédias administrativas e morais, mas a capacidade que ela tem de cegar a crítica para o diagnóstico e a análise de problemas muito maiores.

por Brand Arenari

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Sobre royalties e razão pública – o que é fazer da sociologia um esporte de combate? - Parte II

Interpreto que praticamos um possível ato fetichista com os royalties os dotando de propriedades mágicas que estes não detém per se. Incluso aí o epíteto “maldita herança”, como se estes recursos, dotados de propriedades metafísicas ou transcendentes, possibilitassem que entrássemos agora em um período de peste, fome e destruição de proporções dignas de qualquer meta-narrativa religiosa com a viabilidade de seu término. Karl Marx em seu monumental “O Capital” desmascara o fetichismo, que atribuímos também ao meio “dinheiro”, ao nos revelar cruamente que há o HOMEM detrás deste. As coisas não agem por si, nos as direcionamos com nossa energia vital e em nossas intencionalidades.

Portanto a "culpa" não é dos royalties se estes de fato cessarem ou minguarem substantivamente. A culpa é de cada um daqueles homens e mulheres que simplesmente ignorou “1 milhão de argumentos”. Refiro-me aqui não a 1 milhão em termos de quaisquer cifras como já foi alardeado. Refiro-me a 1 milhão de argumentos produzidos pela inteligência local. Rapidamente ao tomar conhecimento da CAE fui para a minha estante onde encontro dois livros que deveriam estar na cabeceira de qualquer gestor público na planície. Brasil, o desafio da diversidade organizado por José Luis Vianna da Cruz (ed. Senac) e Economia e Desenvolvimeno no Norte Fluminense organizado por Roberto Moraes Pessanha e Romeu e Silva Neto (WTC Editora). No primeiro há especificamente um texto que nos interessa diretamente, do sociólogo da UFF-Campos José Luis Vianna da Cruz intitulado “Os desafios da região brasileira de petróleo” instigante por discutir capital social na planície, dentre outras variáveis. Já o livro de Pessanha e Neto apresenta um contingente de autores estudiosos da região que também alertam e discutem os inúmeros problemas decorrentes de miopia administrativa com recursos que fariam qualquer gestor minimamente interessado tecer loas aos céus, quaisquer que sejam (os céus ou os gestores).De grande importância heurística o corpo de pesquisadores apresenta análises históricas ou contemporâneas sobre o que somos e para onde vamos na eminência da economia petrolífera. Ainda existem, mas não tenho todas em meu acervo, teses, dissertações, monografias, artigos acadêmicos ou na imprensa, que podem talvez atingir a cifra deste 1 milhão positivo.

Um dos fatores que sustento para a derrocada moral é administrativa que se avizinha (ou que decorre) no uso destes recursos é a ojeriza que parcela dos gestores nutre pela inteligência. Ojeriza esta objetivada não há muito tempo quando uma das Universidades locais foi acossada, a olhos vistos na imprensa local, quando discutia a partir de dados e de pesquisas o uso dos royalties especificamente no ensino privado campista. Mas, não seria uma prerrogativa da Universidade justamente elaborar conhecimento crítico? Naquela ocasião os inquisidores odiosos de massa cinzenta arvoraram-se contra tomando a Instituição como refém. Fatos como esse, e a quase ausência de espaço para o debate crítico sobre o uso dos royalties no poder local e a truculência com a qual este foi repelido explicam como estamos. Portanto nenhum homem público que tenha participado em algum momento do agrupamento social “dos que detém (ou detiveram) a caneta” pode reclamar da ausência de recursos inclusive intelectuais. Afora inclusive os recursos injetados aqui pela União em diferentes projetos e rubricas além desta verba, mas isto foge aqui desta reflexão. Utilizaram mal, por longos anos, porque o quiseram. Ou simplesmente o fizeram pela ausência de vestígio de um ethos que incorpore a noção de razão pública, onde política e moral unem-se.

(continua...)

George Gomes Coutinho – sociólogo e doutorando em sociologia política pela UENF