sábado, 19 de abril de 2008

Enfrentando a crise

Como todos nós sabemos uma crise não é algo que surge do acaso, ou mesmo de repente, é sempre o resultado de um processo que vem se desenvolvendo há tempos. E quando essas crises se tornam recorrentes, como é o caso de Campos dos Goytacazes, é o sinal de que algo vai muito mal, há muito tempo, e nos seus primeiros sintomas não foi lhe dado a devida atenção. Para resolver processos como estes é preciso mais que voluntarismo e boas intenções, é preciso primeiro entender o que está acontecendo. E o texto do Xacal intitulado “breve história política de Campos do G. e suas elites. . .” publicado no seu blog “A trolha” , é um convite para isso. Recomendamos a leitura. http://atrolha.blogspot.com/2008/04/breve-histria-poltica-de-campos-dos-g-e.html

8 comentários:

Roberto Torres disse...

Concordo que a questão da crise seja o grande mote para termos um debate não fragmentado aqui. A reconstrução da historia politica de Campos nos ajuda bastante nisso. Pode nos mostrar, por exemplo, como as elites políticas legitimam sua dominação através do controle da maquina estatal. O texto do Xacal é interessante neste aspecto porque ressalta como certo tipo de capital cultural (o bacharelsimo de médicos, etc) é quase um fator invariável entre elites bem diversas ao longo de nossa vida politica. Mas o problema é que, no seu decorrer, esta análise sugere uma espécie de manipulação unilateral como fator explicativo mais importante de todo o processo. Em dado momento, com o fracasso do projeto Muda Campos, os médicos-políticos teriam se desvinculado dos interesses populares... O que são interesses populares? E com isso fica parecendo que o controle do estado paira sobre a sociedade, definindo sua configuração e seus privilégios. É preciso nao perder de vista interesses fora do estado sempre legitimam os interesses dentro dele. Na verdade, os interesses ultrapassam essa pobre dicotomia entre estado e sociedade. E há interesses populares sendo atentidos por essa nova elite politica dos medicos. Afinal, o povão não gosta dos shows milionários? Esse questao é para nos lembrar que, em politica, boa parte dos interesses que movem o povo são irrefletidos enquanto tais.

xacal disse...

Caro Roberto,

Concordo em parte com vc...
Mas não esqueçamos que as forças dominantes e hegemônicas do aparato do Estado é que dão a agenda da sociedade...e por isso tentam à todo custo criar instrumentos, legítimos ou não, para perpetuar sua dominação, que às vezes se reveste de apoio popular...
É para isso que serve o desvio de função que "as elites" fazem desse aparato que dominam e manipulam, e com poucas chances de real intervenção da massa desorganizada...inclusive porque tais medidas de contenção visam aprofundar tal desagregação...

Por isso é que os movimentos de ruptura se apresentam revestidos de vanguardismo que podem se perder no caminho, como o Muda Campos, que embora contasse com amplo apoio popular, não conseguiu construir um vínculo duradouro e qualificado pela própria natureza das suas intenções...

Penso que fora da sociedade organizada não há saída que mereça esse nome...não adianta um "Antônio Conselheiro" ou um "Lacerda" para oferecer alternativa de poder, pois estariam erigidos sobre a mesma base política: o exclusivismo da "verdade" e "razão popular"...

Rodrigo Rosselini disse...

Olá,
Venho louvar a iniciativa desde blog. Tanta gente boa reunida, só poderia dar coisa boa.
Aproveito para convidá-los a participar da manifestação que estamos organizando, em repúdio ao caos administrativo de nossa cidade, no próximo sábado (26/04) no Centro.
Maiores informações em: http://ddclasse.blogspot.com http://rosselini.blogspot.com http://urgente.blogspot.com

Contamos com a adesão e a divulgação de vocês.

Brand Arenari disse...

Há ainda uma outra questão que corre dentre este debate, tão importante quanto perguntar “o que são os interesses do povão?” é perguntar também porque em toda nossa história municipal a dicotomia foi sempre entre uma elite tradicional e uma massa de clientes, nunca houve uma classe intermediária que retirasse seu sustento através de relações não pessoais num número considerável que pudesse dar outros contornos a história política. Assim como nos conta Habermas em “mudança estrutural da esfera pública” ou sobre um outro período da modernidade fala Klaus Eder em “ a novo política de classes”, as classes médias tiveram papel fundamental no cenário político, foram elas forcas modernizantes, não por coincidência foram elas por muito tempo a base de votos do PT.
Só para constar, porque isso merece comentários mais alongados, na década de 80, onde pela primeira vez forcas puramente urbanas entraram na disputa pelo poder municipal, elas estavam divididas em dois segmentos: um mais progressista, representado pelo PT e sustentado sobretudo por profissionais deslocados das relações tradicionais de trabalho, no qual o Cefet tinha um papel de destaque; e por outro lado, um segmento que também se valia da crescente urbanização, mas buscava apoio nas massas da periferia urbana “recém” chegada do campo. E esse grupo, liderado por Garotinho foi o q venceu, com uma proposta não progressista como era a do PT, mas com um viés populista e pesudo-progressista. Garotinho não era a oposição ao poder tradicional dos usineiros e proprietários de terra, como muitos pensavam, ele era tão somente a versão modernizada dessa forma de poder, soube arregimentar o ressentimento de uma nova classe social que surgia, a saber, “a periferia urbana”. Ele teve sucesso porque entendeu o momento político mais do que ninguém. Essa discussão é longa, ainda há muito por desvendar, mas acredito que fizemos um bom começo.
Abraço a todos.

xacal disse...

Caro Brand,

É até bisonho eu tentar discutir com vcs...

O instrumental que dispõe é de longe mais qualificado que o meu...

Mas eu sou insistene, e adoro aprender....

Não há interesses do povão, eu creio, isso que convencionou-se chamar de "interesse popular" é a expressão daquilo qeu expus acima, um misto de necessidades imediatas, mediadas por montanhas de recursos desviados para dar o verniz de massa que todo movimento político exige...

Por outro lado seria arbitrário exigir que só a vontade organizada e politizada de alguns segmentos da sociedade civil, que são sempre minoria, assumam o status de único e legítimo interesse...

O desafio é realizar, politicamente, a junção dos "interesses" populares em satisfazer sua necessidades imediatas, para que a aprtir de então o debate se qualifique, sempre tendo como premissa normas, formalidades e critérios que possibilitem a um número sempre maior de intervenções...

Penso, por derradeiro, que não essa dicotomia: interesse "popular" e interesse republicano...o que os detentores do poder fazem, de forma inteligente, é fragmentar essa discussão, e sua expressão na realidade para perpetuar seus privilégios...

Segue a discussão...

xacal disse...

Tem texto novo saído do forno: chance perdida, uma autópsia do editorial da Folha da Manhã de hoje..

VP disse...

Xacal,

Gostei muito do texto sobre o editorial da Folha da Manhã de hoje. Isso eu já disse no seu blog. A crítica acerca do fato de vc não elogiar a franqueza também.

Agora vai um elogio também franco: é inegável que seus textos estão com outro direcionamento nas últimas semanas. Muito melhores!

Isso é para dizer que vc deve parar com essa síndrome de vira-lata de que é "bisonho" discutir conosco. Vc é um dos poucos que tiveram a paciência e a coragem de se expor aqui. E com muita qualidade, não preciso repetir.

Se discordamos, é da vida. E nenhum de nós aqui nesse espaço, eu garanto, utilizará do argumento de autoridade para impor sua opinião.

Para voltar à questão, quanto ao conceito de interesses imediatos, não se esqueça que se alimentar é um interesse imediato do ser humano. E o maior feito do governo federal foi exatamente nessa área.

Não sejamos incautos, a política também se faz de interesses imediatos, e estes não são menos nobres do que os mediatos. Ao negar a existência, ou mesmo desqualificar esses interesses pode ser perigoso. Daí surgiu as justificativas para frear o movimento da universalização do voto no século XIX e início do XX. Não esqueçamos também de mencionar que os questionamentos ao BOLSA FAMÍLIA feito pela ultra-esquerda e ultra-direita também se utiliza destes mesmos argumentos.

Sei que vc, Xacal, não compartilha dessa justificativa, mas é preciso entender que esses argumentos se desembocam na origem do autoritarismo.

Não compartilho com vc na questão do significado da democracia. Acho também que vc comente um equívoco conceitual ao atribuir um significado para além dos mecanismos instrumentais de resolução de conflitos. Obviamente, quando as regras da maioria são impostas num vácuo de valores preestabelecidos, pode ocorrer desastres avassaladores. Mas à democracia não se pode atribuir esses valores (aqui éticos, como significado de respeito à vida do adversário, entendido como a não eliminação do outro) . Não são intrínsecos, são externos, porém, necessários para a própria manutenção da democracia.

Caso assim não o conceba, corre-se o risco de abandonar a democracia por resultados que ela não gerou. Esse foi o equívoco da nossa transição, mentiram à população ao afirmarem que teríamos mais crescimento com o regime democrático. Isso é uma falácia com origem numa correlação espúria. Democracia não garante crescimento. E o inverso também já caiu por terra (procure os textos do ACEMOGLU do MIT no Google scholar), ou seja, a idéia que crescimento econômico teria um efeito positivo sobre a queda dos regimes autoritários.

Enfim, essas discussões podem não dar em nada imediatamente, mas a discussão está interessante.

Abraços,

xacal disse...

Acho que não me fiz claro...

Não desconsidero os interesses imediatos, não muito pelo contrário...

Apenas não coloco sobre eles toda a possibilidade de diminuir a responsabilidade e do monopólio da agenda do Estado, mantida pelos grupos hegemônicos...

É claro que os interesses imediatos são importantes e influenciam a política...e a Bolsa Família é justamente a junção de uma necessidade tática (alimento) com uma visão estratégica (sair da pobreza) implementada por quem contrla o poder, enquanto em Campos dos G., e no Estado do Rio as políticas de distribuição de renda desembocaram onde já sabemos...

Repetindo o parágrafo:

"O desafio é realizar, politicamente, a junção dos "interesses" populares em satisfazer sua necessidades imediatas, para que a aprtir de então o debate se qualifique, sempre tendo como premissa normas, formalidades e critérios que possibilitem a um número sempre maior de intervenções..."

O que vc considera equívoco eu considero uma distinção conceitual...os instrumentos de exercício e resolução da democracia é que a definem...do ponto de vista qualitativo, há democracias mais eficazes do qeu outras, portanto esse expressão instrumental é que nos permite enxergar e valorar a democracia...

Sem isso, ela é apenas uma bela palavra na estante...