sábado, 12 de abril de 2008

Pós 11 de março Parte I - Prolegômenos a um debate sobre o espaço público em Campos

Pensando o espaço público em Campos – Parte I – O pós-11 de março

Escrevo neste dia 30 de março na planície. Passaram-se praticamente três semanas desde que ocorreu a importante ação da Polícia Federal em que após meses de investigação, com direito a escutas telefônicas, apreensões de documentos e filmagens, parte substantiva do staff da administração do prefeito Alexandre Mocaiber, neste momento afastado pela justiça, ou foi encaminhada para o cárcere ou encontra-se sob severa investigação. Neste ínterim foram desenvolvidas as mais díspares e interessantes análises que pululam seja no “admirável mundo novo” dos blogs ou até mesmo na polarizada imprensa escrita, condição esta jamais admitida mas assim compreendida até mesmo pelo mais pueril senso comum, como diria a linguagem corrente da academia, que caminha pelo Boulevard. Neste tocante podemos sumarizar em quatro vertentes os posicionamentos construídos e sustentados neste pós-11 de março:

1) Identifica-se claramente a tentativa de trasladar a crise política atual para outros grupos que ainda não foram diretamente afetados nominalmente pelos movimentos da justiça federal. Evidente que aqui vislumbra-se a meta de “converter” a opinião pública pensando em dividendos eleitorais para o próximo pleito. Destaca-se o uso de uma linguagem agressiva e com forte caráter denuncista, unilateral e manipulado de informações;

2) A busca por minimização constante dos feitos e das conseqüências da ação da Polícia Federal onde supostamente apresenta-se a defesa de um hipotético coletivo “bem maior” e um discurso claramente apologético da impunidade descriminalizando os responsáveis. É expresso em um palavrório anti-meritócrático onde é feito o alarde de que se avizinha uma possível crise na economia de bens e serviços campista asseverando que os “fins” justificam os “meios”: na gestão anterior de Mocaiber convivíamos (e convivemos) com quase 20000 contratados movimentando o comércio e ponto final;

3) Os acontecimentos pós-11 de março significam de forma clara a possibilidade de encetar modificações substantivas na administração pública municipal primando pela eficácia no uso de recursos públicos. Esta é uma postura propositiva mas minoritária dado que é necessário um mínimo de reflexividade para produzi-la;

4) Por fim, uma leitura expressa na urgência de reinvenção da política local sem possibilidade de alianças com quaisquer grupos. É uma via de clara ruptura radical com o modus operandi vigente. Por razões auto-evidentes esta postura é ainda mais minoritária que a descrita no ponto anterior dado o seu posicionamento “jacobinista” ou “republicano puro sangue”.

De toda forma resumidamente há dois pontos de continuidade (posicionamentos 1 e 2) e dois posicionamentos de ruptura negociada ou não (pontos 3 e 4). Meu interesse neste momento não é aderir ou repelir nenhum dos quatro pontos apresentados. Em concordância com a postura defendida por uma abordagem hermenêutica deste complexo fenômeno, me interessa tentar compreendê-lo antes de tomar um posicionamento público. E é este o objetivo desta série de artigos/crônicas que pretendo compor, fundados na reflexão interessada de um praticante das ciências sociais em Campos dos Goytacazes sobre os usos, abusos e desusos do e no espaço público local. É uma reflexão fruto não tanto de uma pesquisa aplicada sistemática mas, sim, de um olhar especializado em que há a tentativa de tornar os últimos eventos dotados de sentido com alguma profundidade analítica. Este momento em Campos pode ser ou não decisivo. Mas antes do otimismo da vontade, por dever do ofício, me cabe o pessimismo da razão onde pretendo argumentar que os déficits participativos e a penúria combativa, além da espetacular ineficiência que coexiste com a abundância de recursos, se devem a um tipo específico de atuação no espaço público local gerando uma conseqüente esfera pública esquálida. Entendam que a atual condição estrutural desta cidade é legítima para o grosso da população sendo esta o sustentáculo destas perversas relações.

Interpreto este fenômeno apenas como um momento de clímax do drama social vivido pelos campistas, como poderia sugerir o antropólogo Victor Turner. Mas, como insinua esta imagem, o clímax de qualquer trama social só faz sentido se acompanharmos os elementos que o geraram e o condicionam. Desta forma, de maneira até anárquica, pretendo apresentar alguns argumentos que ambicionam explicitar sob um olhar sociológico os motivos pelos quais estamos nesta constrangedora situação. Assevero apenas que o 11 de março só é explicável por questões que o antecedem em relações até então improváveis não explicitadas pelos quatro posicionamentos pós 11 de março.

George Gomes Coutinho – sociólogo e doutorando em sociologia política pela UENF

Um comentário:

xacal disse...

Senhores,

Fiz comentário semelhante no blog do Roberto...

Será necessário estabelecer uma alternativa que devolva a sociedade, fora da estrutura da máquina administrativa, a autonomia ecônomica, e a capacidade de operar a política...

Com o advento da decadência das atividades econômicas que prevaleciam, monocultura sucro-alcooleira, houve um deslocamento do eixo de poder...

Os "coronéis" e outros grupos da elite mantinham a dominação política como expressão de sua dominação econômica, e perderam essa condição quando suas finanças entraram em colapso...

Esse deslocamento se aprofundou com o crescimento dos repasses dos royalties...

A partir de determinado momento a PMCG deixa de "depender" da sociedade, através do recolhimento e tributos, por exemplo, e passa a inverter os sinais...A PMCG é que gera riqueza, portanto, serão os burocratas alçados a eminências políticas que decidirão o destino econômico da das empresas...

Em uma rápida rearticulação de seus interesses, uma parte da elite alijada, associou-se aos novos mandatários, e agora, dentro do universo administrativo, passa a conduzir seus negócios...

Claro, nessa condição será impossível distinguir público de privado...

Com a atividade econômica absolutamente impregnada pelos tentáculos da PMCG, não haveria ourta alternativa para os cidadãos dos degraus inferiores da pirâmide senão "aderir" e resgatar algumas "migalhas" do esquema...

Com isso, e a troca de votos, deu-se o "verniz" popular, que, no entanto, nada tem e coletivo...

O desafio de qualquer grupo que deseje romper com essa lógica é devolver a sociedade sua autonomia, para que a administração volte a ser uma mediadora das demandas...