Hoje no Blog “a trolha” Xacal apresentou um texto no qual se propõe dissecar o editorial do jornal “folha da manha” deste domingo. Xacal o faz muito bem, e de maneira bem divertida. Pegando carona na empreitada do Xacal, tecerei eu aqui alguns comentários complementares.
Acredito que dois aspectos se destacam no editorial da “Folha”. O primeiro deles é a clara tentativa de deslocar a imagem de Mocaiber de tudo o que aconteceu na prefeitura de Campos dos Goytacazes. Tentam nos passar a imagem de que ele foi vítima, ou quase um refém nas mãos de auxiliares corruptos. E logo, vende-se o peixe que a troca destes auxiliares resolveria o problema, do qual Mocaiber pouco teria responsabilidade. Creio que estamos um pouco acostumados com essa estratégia, assim os defensores de Lula fizeram. Queriam que acreditássemos que Lula não sabia do que faziam seus assistentes diretos, que ele era um homem simples e de bom coração enganado por espertos corruptos. De certa forma vimos isso com a imagem do ex-prefeito Arnaldo Viana, quem nunca ouviu em Campos que a suposta corrupção do governo de Arnaldo era culpa de sua esposa e não dele, que também era visto com um homem de bom coração etc..
No entanto, o segundo aspecto que ponho em destaque, creio ser mais prejudicial que o primeiro, muito embora não estão eles totalmente deslocados um do outro, até se complementam. O segundo aspecto que ponho em destaque é propagação da idéia presente no editorial da “folha”, que nos conduz a acreditar que podemos apagar tudo, ou melhor, esquecer tudo e começar um novo governo de Mocaiber. Existe aí a tentativa, ou a crença (se julgarmos que tem boas intenções), que podemos tirar o conteúdo histórico de tudo o que se passou, e partir agora do zero. Logo esvaziando qualquer possibilidade mais profunda de debate que nos leve uma compreensão melhor do que se passa em Campos dos Goytacazes.
Nesta lógica, somos conduzidos a pensar a realidade de forma fragmentada, acreditando que os fatos se dão a partir do acaso e não detêm nenhuma história ou razão de ser. Assim, pensamos que os problemas que nos assolam dizem respeito somente a eventos isolados ou a má sorte de um homem de poucos escrúpulos nos governar. E então, respondemos ingenuamente que para solucionar isso é preciso apenas trocar os homens que estão no poder. Trocar homens imorais por homens morais. (No caso do Editorial da “Folha” isso é pior, porque crê que o mesmo homem que agiu de forma incorreta pode voltar e de repente agir de forma correta, não se dão o trabalho de ao menos trocar os homens). E aí reduzimos a questão da política à moral, e perdemos a oportunidade de entender o que se passa conosco.
O que o editorial da folha não nos deixa ver é que a crise política de Campos dos Goytacazes, creio já ter dito isso antes, não é obra do acaso ou de fatos isolados, não é algo passageiro e ocasional. É ela uma crise endêmica, sistêmica. Não diz respeito a homens isolados, e as formas de conduta destes, mas sim diz respeito a toda uma sociedade. Precisamos saber que a doença que nos acomete é o “mal de Hansen”(antigamente chamado de lepra), e não se trata desse mal colocando Band-aid e mercúrio cromo em suas feridas.
por Brand Arenari
7 comentários:
ótimo texto...
mBrand,
Sua análise é correta, mas, a questão que se impõe a partir dela é: como tratar a "lepra"?
Estou ciente que a resposta não é simples e muito menos fácil. Os determinantes históricos deste processo parecem resistir duramente a qualquer intervenção. No entanto, pragmaticamente falando, a compreensão do quadro só fara sentido se trouxer consigo a gênese de algo novo. É correta a sua visão de que não podemos reduzir esta questão à moral, no sentido de uma História tradicional, feita a partir de homens maniqueisticamente entendidos como bons ou maus. Porém, não podemos ignorar que o jogo político que se desenrola o faz sim a partir de determinantes morais, num sentido mais amplo. Ou seja pautando-se na falta de sólidos princípios de conduta política ética e consciente por parte do eleitor, daquele que, bem ou mal, decide os rumos de um pleito. O que esperar de um governante ou legislador que usa de instrumentos os mais excusos para eleger-se, e consegue?
A guisa de exemplo, basta observar mais detidamente o perfil dos que sairam a rua na sexta, em explícito apoio ao prefeito corrupto afastado. A grande maioria são pobres diabos que têm recebido tão somente migalhas da corrupção. As pessoas não só se vendem como se vendem barato. Para reverter o quadro político do município não basta um bom projeto. É preciso, por um lado, trabalhar no sentido da conscientização e do amadurecimento do eleitor, e, por outro, na neutralização dos mecanismos de operacionalização do feirão eleitoral.
Adiro à crítica de Brand e compreendo o ponto de vista de Manoel, que nos induz a pensar quais referências de nossa história recente podemos mobilizar em torno de uma crítica propositiva à crise institucional no município. Não basta recaírmos no lugar-comum que afirma ser Campos uma "síntese" do Brasil, pois isso nada diz sobre a singularidade de sua formação histórica - uma questão substantiva que vem sendo tratada em inúmeros textos neste blog. Ainda quero retomar este assunto aqui.
Caro Manoel, seguramente, nem de longe eu tenho a resposta para a sua pergunta, mas posso dizer que, a melhor maneira de enfrentá-la, é não ter afobação para respondê-la. O pior que pode acontecer conosco, que nos propomos a ser críticos nesse processo, é oferecer respostas rápidas e conseguintemente rasas. Não podemos cair na tentação de querer satisfazer o que esperam de nós neste momento, ou seja, soluções prontas para a crise. As pessoas em geral querem que nós as ofereçamos respostas curtas e rápidas para o problema, e de preferência que a nossa resposta de respaldo ao que eles já pensam. Temos que fugir disso. Mas não pensemos que a resposta não virá, ela virá. Não da cabeça de um de nós, mas do debate de todos, caso persistamos. Mas não teremos também uma única resposta, teremos algumas, que serão desconstruídas e reconstruídas por gerações vindouras, caso tenhamos sucesso em nossa empreitada. O que de melhor nos podemos fazer agora não é dar uma resposta para a crise, mas sim ao tentar fazer isso, constituir uma esfera legítima de debate como nunca houve em Campos, e fazer com que isso seja incorporado pela a sociedade campista. Se conseguirmos isso Talvez não obteremos resposta para essa crise, mas evitaremos muitas outras crises vindouras.
Quanto à questão da moral Manoel, julgo ser ela tão importante que não responderei aqui. Eu e outros membros do blog publicaremos mais artigos sobre o tema na próxima semana, e assim creio dar seguimento ao debate. Como sei que vc estudou a moral em Santo Agostinho, o convido para publicar um artigo no nosso blog sobre o tema de moral e política em Agostinho, dando suas opnioes, claro. E assim participa mais ainda do debate conosco.
Um fraterno abraço, Brand.
Caro Brand, sei que compreende que a pergunta foi apenas provocativa, mas, mesmo assim, gostaria de esclarecer para todos os companheiros deste debate que nunca tive a intenção de lhe imputar tamanha responsabilidade.
Concordo plenamente com sua compreensão de que a resposta é maior do que nós e sei que não devemos nos precipitar, de forma afobada, no sentido de encontrar uma solução "fast food" para o problema.
Na verdade, minha verdadeira intenção coicide com a sua, a saber: promover o debate, a reflexão, o crescimento a partir da riqueza da troca de idéias. Esta é "a gênese de algo novo" ao qual eu me referi no comentário anterior.
Quanto ao convite gostaria de dizer que sinto-me honrado em recebe-lo. Embora meus estudos não tenham enfatizado a questão da moral, acredito que posso contribuir de alguma forma para o debate. Assim que possível enviarei o artigo sugerido.
um grande abraço
Caro amigo,
Mais uma vez parabéns pelos textos, especialmente este.Análise mais verdadeira impossível.
Talvez a população de Campos, em especial a juventude , não tenha percebido que a vida pode estar nos possibilitando momento único de debate profundo, troca de idéias , aperfeiçoamento e, principalmente, um "chacoalhar nos ossos" como se nos dissesse:"este é o momento da virada.Lutem e busquem um destino melhor.Não desistam!!!".
Este é o espírito que devemos disseminar.Da esperança,de não aceitar o mais ou menos.E sim, exigir sempre o melhor.
Grande abraço,
Felipe Diniz.
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