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sábado, 13 de março de 2010

Como se defender da “defesa” dos royalties?

Paulo Sérgio Ribeiro

A emenda do deputado federal Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) a favor da distribuição equitativa dos royalties do petróleo entre as unidades da federação repercute no espectro político “campista” como uma situação-limite para os municípios do Norte e Noroeste Fluminense, na medida em que os respectivos orçamentos públicos passaram a ser constituídos, com graus de dependência variáveis, pelo volume desses recursos financeiros. É inegável a centralidade desses recursos para a política fluminense, a despeito do poder de influência de seus agentes na política nacional de petróleo. No entanto, a recente mobilização em Campos dos Goytacazes pela manutenção dos royalties suscita o entendimento (um tanto duvidoso) dos problemas do município como que resumidos à reedição de um “O petróleo é nosso!” numa campanha à esquerda e à direita pela defesa da legitimidade da distribuição atual dos royalties, já que estes seriam proporcionais às necessidades engendradas pelo crescimento econômico do eixo Campos-Macaé. Se este for o horizonte programático, predomina então uma visão economicista que tem por efeito negligenciar a discussão sobre o quão sustentado pode ser esse crescimento num cenário que faz coexistir tecnologias de ponta, super-exploração da força de trabalho e pobreza massificada.

Mesmo no caso de um apoio condicional àquela campanha por segmentos da sociedade civil capazes de vocalizar uma mudança de forma e de conteúdo da política em Campos dos Goytacazes há de se pensar um projeto de desenvolvimento que tenha o foco não necessariamente nas conseqüências de um novo arranjo distributivo dos royalties para esta porção do território fluminense, mas, primeiramente, na compreensão de seus antecedentes históricos. Para tal tarefa não encontro abordagem mais oportuna do que a de José Luis Vianna da Cruz (2005) ao qualificar o advento dos royalties do petróleo como uma face local de nossa modernização conservadora. O trabalho de Cruz expõe com clareza a reconfiguração política do norte do Estado do Rio de Janeiro a partir da onda de municipalização da segunda metade da década de 1980, além de indicadores sobre o mercado de trabalho que confirmam o aprofundamento das desigualdades sócio-econômicas nas últimas décadas. Vale a pena nos apropriarmos da maneira como Cruz interpreta tais indicadores, especialmente quando contextualiza o “regionalismo” como uma gramática política dominante que, hoje, é modulada pelo acirramento dos conflitos federativos em torno de um marco regulatório para o “Pré-Sal”.

Qual seria o fundamento prático do regionalismo na referida abordagem?

O progressivo esvaziamento econômico do Noroeste Fluminense com a erradicação da lavoura cafeeira em meados do século passado; o deslocamento do centro dinâmico da agroindústria sucroalcooleira para São Paulo e a desorganização da economia fluminense com a mudança do distrito federal do Rio de Janeiro para Brasília acentuariam a condição periférica do Norte Fluminense, dando margem a uma perspectiva de modernização que, durante a ditadura civil-militar (1964-1985), demarcava na monocultura da cana e na sua agroindústria o terreno por excelência de uma intervenção federal na região. Para Cruz, tal intervenção sedimentou um “fechamento da região”. Os não poucos recursos da União rubricados pelo Instituto do Açúcar e Álcool (IAA) e pelo Plano de Racionalização da Indústria Açucareira e do Programa Especial do Álcool (Proalcool) seriam repassados à região sob o controle estrito da oligarquia agrária de Campos dos Goytacazes, atestando a eficácia de um discurso sobre o desenvolvimento regional ancorado no prestígio de suas lideranças na região histórica do Norte Fluminense e na comunidade de interesses instituída na partilha do butim do Proalcool entre aquele patronato fazendeiro, mandatários, técnicos e alguns sócios menores no comércio e jornalismo locais (alguns editoriais ainda são bastante didáticos quanto ao teor bairrista dessas alianças).

Ora, a transferência de recursos para a região sob os auspícios da “Viúva” não era problema antes dos royalties, sobretudo quando traduzida pelo velho expediente do privatizar lucros e socializar prejuízos. A modernização da agroindústria sucroalcooleira tutelada pelo Estado implicou, por um lado, na expansão da monocultura da cana em detrimento das lavouras de subsistência e, por outro, no declínio da antiga cadeia produtiva que supria o aparato técnico das usinas devido à sua dependência tecnológica em relação à indústria paulista. Para o trabalhador rural haveria poucas chances de integrar-se àquele ciclo modernizador senão pela generalização do vínculo de trabalho clandestino – a ante-sala do inferno chamado trabalho escravo –, pela alternância do trabalho rural com o biscate urbano ditada pelo ritmo sazonal da produção açucareira e pela degradação de seu modo de vida com a favelização posta como alternativa (ou falta dela) ao recrudescimento do monopólio da terra. Cruz ressalta a pobreza estrutural dessa fração da classe trabalhadora, entregue à própria sorte ao engrossar o contingente de desempregados e subempregados cuja amplitude pressiona para baixo os salários e restringe as oportunidades de realização das camadas populares aos serviços não exigentes quanto à educação formal.

Com freqüência nos deparamos com o seguinte raciocínio: a diminuição dos royalties em Campos pode causar desemprego. Ora, por que o alarde? Talvez pela crença coletiva na correlação entre os royalties do petróleo e uma idéia difusa de “progresso”. Embora louvável quanto aos fins nela presumidos, tal crença não resiste a um único dado do trabalho de Cruz: os empregos gerados pelo complexo extrativista de petróleo, em torno de 40 mil desde os anos 1980, não superam o excedente de mão de obra produzido pelo simples crescimento vegetativo da PEA entre os anos 1970 e 2000 e pela perda de postos de trabalho no complexo açucareiro entre 1980 e 2000, respectiva e aproximadamente 40 e 35 mil pessoas, com o agravo de que não seria possível (nem razoável em face dos preceitos universalistas do direito ao trabalho) assegurar a partir da economia do petróleo uma reserva de mercado para a região posto que sua mão de obra é recrutada em todo o país. Desse modo, os royalties do petróleo, como recursos tributários oportunos para uma nova política de desenvolvimento que venha a incorporar a questão social radicada no Norte e Noroeste Fluminense, têm seus usos prescritos pelo consenso conservador em torno da “região” como um pretenso destinatário genérico daqueles recursos, servindo assim a toda sorte de mistificação.

Contra essa ideologia regionalista, vale lembrar a recomendação de Celso Furtado (2003), a qual José Luis Vianna da Cruz segue de perto, de não nos recolhermos nos antolhos da especialização nas ciências sociais que induzem a separar forçadamente o estudo dos fatos econômicos do estudo dos mecanismos de ordem sociocultural que condicionam o comportamento dos agentes que constroem esses fatos cotidianamente. Noutros termos, tanto ao estudioso quanto ao ativista cabe entender a conexão de sentido entre a idéia de região e as escolhas possíveis na disputa pela mudança da ordem social; disputa esta inscrita no próprio imaginário que permeia a região ora como a idéia de um futuro em aberto, ora como a morte no nascedouro de aspirações sociais progressistas sem as quais não se viabiliza a reconstrução do consenso em bases verdadeiramente populares.

A ascensão de um bloco de poder a partir dos impactos da economia do petróleo nos governos municipais não contradita, senão confirma, que o esvaziamento antes de ser econômico é político, na medida em que se reiterou sob novas formas o padrão de gestão pública caracterizado pelo poder desmedido de um grupo político que mantém o controle privado dos recursos federais arrecadados localmente. Aqui, creio que ser válido perguntar: como se defender da “defesa” dos royalties? Será que a resposta recairia numa espécie de regionalismo estratégico pelo qual se corre sempre o risco de legitimar os “de sempre” em prejuízo dos “de baixo”? Ou seria o caso de pensarmos que esse regionalismo é subsidiário da ausência de um debate sobre o orçamento público a ser promovido pelas forças de esquerda em Campos dos Goytacazes? Com um tímido e não menos sincero “otimismo da vontade” lembro do PT, do PSOL e de nossas poucas associações civis independentes como um campo político no qual os termos de um orçamento público participativo sejam discutidos e reivindicados de modo diverso da chantagem cínica e mal-disfarçada em slogans como “Nossa região” ou “Nossa Campos”.

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Recomendação de leitura: o trabalho de José Luis Vianna da Cruz que consultei encontra-se na coletânea, organizada pelo próprio autor, "Brasil, o desafio da diversidade", editada em 2005 pelo Senac. Outra boa fonte de estudo segue abaixo:

FURTADO, Celso. Raízes do subdesenvolvimento. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.

Há também muitas pesquisas defendidas no curso de graduação em ciências sociais e nos programas de pós-graduação do CCH/UENF que tratam de temas e problemas relativos à região Norte e Noroeste Fluminense.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Dois Recados - Simpósio de Jornalismo Científico e Rodrigo Serra Debatendo Royalties

Prezad@s,

Dois recados envolvendo ações da UENF. Um chamando para os minicursos que ocorrerão no "I Simpósio de Jornalismo Científico.

O outro refere-se ao projeto "Participação Política e Estado – implementação institucional de ações para o controle social dos governos locais".


O projeto em questão chama para a aula do professor Rodrigo Serra amanhã no IFF onde terá lugar o fundamental debate para esta região e arredores: a questão dos royalties.

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Prezados(as) inscritos no 1.º Simpósio Nacional de Jornalismo Científico,

Informamos que, além de prorrogar as inscrições para o Simpósio, incluímos dois minicursos na programação: 'Faça o seu blog' e 'Tratamento de imagem digital'. Eles serão ministrados respectivamente por Fabrício Silva Santos e Alexsandro de Azevedo, dois profissionais da área de Comunicação da Uenf. Os minicursos serão simultâneos, em 26/11, das 9h às 11h. Logo não será possível participar dos dois.

Como as vagas são limitadas, quem tiver interesse em um dos minicursos deve se apressar e inscrever-se na própria página do Simposio (www.uenf.br/simposio).

Já somos mais de 300 inscritos, entre jornalistas, estudantes de Comunicação, pesquisadores, pós-graduandos, bolsistas de Iniciação Científica e outros perfis de cidadãos e cidadãs. Apesar da excelente resposta em inscrições, pudemos prorrogar o prazo em vista da capacidade do Centro de Convenções da Uenf.

Agradecemos o interesse de todos e desejamos um excelente Simpósio!

Gustavo Smiderle e Fúlvia D'Alessandri
Jornalistas da Ascom/Uenf e membros da Comissão Organizadora
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Sábado dia 07.11.09 no IFF, no auditório Reginaldo Rangel, Rodrigo Valente Serra Professor/Pesquisador do Mestrado em Engenharia Ambiental do IFF, dará a aula: Royalties do Petróleo: diferentes formas de distribuir e aplicar as rendas do petróleo. Pretende-se apresentar as formas alternativas de distribuir e aplicar os royalties do petróleo à luz dos projetos de lei que tramitam na Câmara e no Senado; Assim como, proporcionar o debate sobre experiências de controle social sobre distribuição e aplicação das rendas do petróleo no Brasil e no mundo.