quinta-feira, 17 de abril de 2008

Eleições, imprensa e a miopia

A imprensa brasileira importou o modelo americano de como construir formalmente seus textos jornalísticos. São frases curtas, vocabulário restrito e com sujeito, verbo e predicado, necessariamente nessa ordem. Mas parou por aqui.

Diferentemente do modelo francês, geralmente, os textos da imprensa brasileira prescindem de um conteúdo analítico mais acurado. Mesmo os espaços para opiniões são curtos no tamanho e rasos na profundidade. Não que isso represente uma imparcialidade. Como sempre, repete um amigo do jornal “O Globo”: "na redação somos majoritariamente petistas ou simpatizantes da esquerda, mas isso não importa, não somos nós quem define a pauta!". Os repórteres podem ser o que eles quiserem, mas quem define a linha do jornal não vai para a rua, manda quem vai, para onde vai e para o que vai. Isso é no Brasil, isso é no mundo.

O problema, como sempre digo, não é a imparcialidade. Isso é inexorável, é do ser humano. O que causa danos a uma comunicação de qualidade é a pretensa parcialidade que tentam nos vender a todo custo, como se não fôssemos dotados de capacidades reflexivas.

Tenho acompanhado a cobertura das eleições primárias pelos principais jornais americanos. Os ataques aos candidatos são diários, intensos e contundentes. Os temas mais delicados são arremessados para os candidatos com a velocidade de uma bola de baseball. E como no jogo, ganha quem rebate e perde quem deixa passar.

A cada rodada de debates (foram vários até aqui, seja entre os próprios candidatos, seja entre os candidatos e as comunidades), os pretendentes ao cargo máximo da nação americana precisam demonstrar conhecimento sobre temas diversos e habilidade nos discursos. Esses debates são tão importantes que, mesmo com a desistência de todos os oponentes republicanos, John McCain continua freqüentando.

No dia 25 de janeiro, o “The New York Times” publicou dois editoriais intitulados "Primary Choice: Hillary Clinton" e "Primary Choice: John MacCain". Era o início da campanha pelas primárias e o jornal já havia feito as suas duas escolhas, uma para o partido Democrata, outra para o Republicano. Notavelmente, Hillary é a preferida, e o jornal não esconde isso.

O editorial sobre o Republicano foi aberto com a seguinte passagem: "Nós discordamos de todos os pré-candidatos Republicanos". E o segundo parágrafo complementa: "Todavia, uma escolha tem de ser feita. E não é uma escolha fácil." A partir de então, são elencados os predicados (em grande maioria, extremamente negativos), como justificativa para preteri-los.
Com essa postura, o jornal deixou claro ao seu leitor a opinião do corpo editorial. Dos que mandam no jornal. Dos que aprovam a pauta do dia. Dos que escolhem quais jornalistas irão escrever sobre o quê. Dos que dizem: publique ou não!

Em outras palavras, o jornal optou pela franqueza com seus leitores. E isso não significa que são mais honestos, dotados de compromisso moral e ético, ou qualquer coisa que o valha. Essa é uma postura dos que não tem braços curtos, dos que enxergam dois palmos além do nariz. Sabem que os (e)leitores, mesmo sem os editorais, identificariam as opções do jornal. O que distingue e a forma como iriam identificar, ou pelo próprio jornal por meio do editorial, ou ao longo do tempo, por meio do conteúdo do jornal. Ao poupar os custos dos (e)leitores, pouparam sua própria credibilidade.

No Brasil, apenas o jornal “Estado de São Paulo” e a revista “Carta Capital” utilizam dessa franqueza com seus (e)leitores. Um jornal tipicamente conservador que apóia o PSDB, e uma revista progressista de centro-esquerda (seja lá o que isso significa) que apóia o PT.

Importou-se somente o que a imprensa americana tem de pior, conteúdo ralo e textos curtos. Bem a imagem da capacidade intelectual dos que escrevem. Melhor seria ser filho da outra.

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