quinta-feira, 17 de abril de 2008

O que a experiência do PT no poder pode nos ensinar sobre nossa crise municipal

Vários aspectos da experiência do PT no poder têm muito a contribuir para o amadurecimento da nossa compreensão da política nacional, a começar pela inédita experiência de um partido de esquerda no poder. No entanto, dentre esses vários aspectos, um se destaca para este nosso debate, tanto pelo potencial de aprendizado que ele representa para o Brasil como um todo, quanto pela estreita relação que guarda com a nossa crise municipal. E o aspecto ao qual me refiro, infelizmente, diz respeito aos escândalos de corrupção.

Antes de adentrar nos pontos que julgo serem os cruciais deste tema, gostaria de pontuar que corrupção não é algo simples de se descrever, há “corrupções” e “corrupções”, prometo que escreverei sobre este tema posteriormente. Porém não me aterei a isso neste “post”, dedicar-me-ei aqui ao que há de central neste tema, o papel da moral na política.

Durante sua trajetória, não é novidade para ninguém que uma das principais bandeiras do PT foi à bandeira ética. O PT sempre anunciou aos quatro cantos do mundo sua superioridade moral em relação aos outros partidos. Mesmo com os escândalos de corrupção no governo federal eu não duvido que o PT talvez seja realmente o partido menos corrupto do Brasil, porém não é isso que importa aqui, o que importa é o atraso político que ocorre quando as discussões políticas giram apenas entorno do tema da moral. E quanto a isso, o PT tem uma grande parcela de culpa. Por muito tempo, o principal argumento da oposição petista foi contra a corrupção. Acreditava, ou alardeava, que a corrupção era faceta do capitalismo (o que a história nos mostra que estavam equivocados), e depois que a dicotomia socialismo-capitalismo perdeu força, a direta passou a ser para o PT a depositária natural da corrupção. Assim, ao invés de se discutir um projeto alternativo para o país, o PT acreditava, ou alardeava, que o simples fim da corrupção, que se daria com a chegada do PT no poder, faria o Brasil deslanchar de vez, não só como uma boa economia, como também um país mais justo. Enfim, a moral, se não era o principal programa de governo do PT, era ao menos o mais propagandeado.

No entanto, o PT chegou ao poder e esse sonho dourado ruiu. Essa chegada funcionou para o PT e para todos aqueles que acompanharam no papel de observadores entusiasmados sua trajetória, (e eu me incluo aí), como um rito de passagem. Era a hora de sair da infância e entrar no mundo adulto. E o primeiro desafio quanto a isso, era ter maturidade para encarar a dura realidade que para governar um país como o Brasil é preciso mais que boa vontade e um coração imaculado. E o segundo desafio, tão duro ou mais que o primeiro, era olhar pra si mesmo e perceber que não se tinha o coração, nem mesmo de longe, tão imaculado assim.

O PT parece ao menos em parte ter aprendido a lição, mesmo sem ser um exemplo de honestidade, um exemplo de ética e moral, faz um dos melhores governos que já tivemos, que consegue estabelecer melhorias no nosso maior mal, muito pior que a corrupção, a saber, a desigualdade social, além de não ir mal na economia. Isso causa para nós, homens comuns que não vivem dentro da política, um desconforto terrível. Somos obrigados a refletir que o mundo da política parece ser diferente daquele em que nós vivemos no nosso cotidiano, as regras que valem para o nosso mundo funcionam diferente na política. Os conselhos da vovó e da catequese que aprendemos com aquele padre velhinho e bonzinho, mesmo que sejam importantes para o nosso dia-a-dia, não são tão fundamentais assim para o mundo da política.

Precisamos apreender com a experiência do PT que não é apenas com corações imaculados que faremos uma boa política, até porque esses são difíceis de se encontrar por aí (os escândalos de corrupção do PT provaram isso), quando menos esperamos vemos que até mesmo nossos corações não são tão puros. Na Alemanha, país que muitos gostam de tomar como exemplo, o grande herói da reunificação, o político e ex-chanceler Helmut Kohl, foi pego com problemas referentes a verbas de campanha. No mês passado, a reitora de uma das grandes universidades de Berlim foi acusada de comprar um apartamento de 60.000 € com verba pública. Com isso, podemos ver que corrupção não é um “privilégio” só nosso, bem diferente de uma brutal desigualdade social, diferente de um capitalismo que se desenvolveu numa sociedade escravocrata (e quanto a isso Campos está no olho do furacão), que são problemas só nossos. Por que então só falar de corrupção?

Despender a maior parte do tempo com lamúrias morais, ou acusações e denuncismos, não é apenas a forma com que nossos líderes políticos locais ou nacionais escondem sua mediocridade, mas é também a forma com que nós, que nos propomos ser críticos, demonstramos a nossa incapacidade de tecer análises mais acuradas e pontuais a respeito de nossos maiores problemas. Assim como todos, eu também gostaria que os nossos políticos fossem menos corruptos, mas penso que um mal pior do que a corrupção pode nos fazer, não são as tragédias administrativas e morais, mas a capacidade que ela tem de cegar a crítica para o diagnóstico e a análise de problemas muito maiores.

por Brand Arenari

2 comentários:

Roberto Torres disse...

Antes de mais nada, peço desculpa por estar acompanho as discussões. Estou um pouco enrolado com outros assuntos esses dias. Em pouco dias volto assiduamente. E estou preparando uma provocação ao tema da "crise política" em Campos. Mas Brand já fez parte dela. E por isso adorei o texto. Concordo plenamente que se o aprendizado interno do PT puder nos ajudar em algo, será o de rever a centralidade política do tema da corrupção! A esquerda como um todo compra, sem se dar conta, o discurso moralista do liberalismo mesquinho e vulgar que elege a "ética na política" como tema fundamental da política. E na medida em que o debate sobre a "economia política" perdeu força, esse "teminha" se tornou a grande questão. Que me perdoem todos aqueles que infelizmente dedicam sua vida intelectual a estudar ou pensar sobre isso, mas o tema da corrupção é teminha por que amesquinha a própria política. O que essa tal crise política de campos se não uma crise de corrupção denunciada pela mídia e pelo MP? Antes de 11 de março nao havia crise? Enfim, é como se a crise surgisse no estado, como se ela fosse uma crise de lideranças políticas. A crise social, a desigualdade estrutural que permite e legitima o privilégio de todo tipo, entre eles a corrupção, nunca são vistos ! Ora, precisamos estar mais sóbrios para nao deixar a mídia ditar a agenda de nossos debates!

Anônimo disse...

Tudo menos sóbrios, por favor!