quarta-feira, 16 de abril de 2008

Sobre royalties e razão pública – o que é fazer da sociologia um esporte de combate? - Parte II

Interpreto que praticamos um possível ato fetichista com os royalties os dotando de propriedades mágicas que estes não detém per se. Incluso aí o epíteto “maldita herança”, como se estes recursos, dotados de propriedades metafísicas ou transcendentes, possibilitassem que entrássemos agora em um período de peste, fome e destruição de proporções dignas de qualquer meta-narrativa religiosa com a viabilidade de seu término. Karl Marx em seu monumental “O Capital” desmascara o fetichismo, que atribuímos também ao meio “dinheiro”, ao nos revelar cruamente que há o HOMEM detrás deste. As coisas não agem por si, nos as direcionamos com nossa energia vital e em nossas intencionalidades.

Portanto a "culpa" não é dos royalties se estes de fato cessarem ou minguarem substantivamente. A culpa é de cada um daqueles homens e mulheres que simplesmente ignorou “1 milhão de argumentos”. Refiro-me aqui não a 1 milhão em termos de quaisquer cifras como já foi alardeado. Refiro-me a 1 milhão de argumentos produzidos pela inteligência local. Rapidamente ao tomar conhecimento da CAE fui para a minha estante onde encontro dois livros que deveriam estar na cabeceira de qualquer gestor público na planície. Brasil, o desafio da diversidade organizado por José Luis Vianna da Cruz (ed. Senac) e Economia e Desenvolvimeno no Norte Fluminense organizado por Roberto Moraes Pessanha e Romeu e Silva Neto (WTC Editora). No primeiro há especificamente um texto que nos interessa diretamente, do sociólogo da UFF-Campos José Luis Vianna da Cruz intitulado “Os desafios da região brasileira de petróleo” instigante por discutir capital social na planície, dentre outras variáveis. Já o livro de Pessanha e Neto apresenta um contingente de autores estudiosos da região que também alertam e discutem os inúmeros problemas decorrentes de miopia administrativa com recursos que fariam qualquer gestor minimamente interessado tecer loas aos céus, quaisquer que sejam (os céus ou os gestores).De grande importância heurística o corpo de pesquisadores apresenta análises históricas ou contemporâneas sobre o que somos e para onde vamos na eminência da economia petrolífera. Ainda existem, mas não tenho todas em meu acervo, teses, dissertações, monografias, artigos acadêmicos ou na imprensa, que podem talvez atingir a cifra deste 1 milhão positivo.

Um dos fatores que sustento para a derrocada moral é administrativa que se avizinha (ou que decorre) no uso destes recursos é a ojeriza que parcela dos gestores nutre pela inteligência. Ojeriza esta objetivada não há muito tempo quando uma das Universidades locais foi acossada, a olhos vistos na imprensa local, quando discutia a partir de dados e de pesquisas o uso dos royalties especificamente no ensino privado campista. Mas, não seria uma prerrogativa da Universidade justamente elaborar conhecimento crítico? Naquela ocasião os inquisidores odiosos de massa cinzenta arvoraram-se contra tomando a Instituição como refém. Fatos como esse, e a quase ausência de espaço para o debate crítico sobre o uso dos royalties no poder local e a truculência com a qual este foi repelido explicam como estamos. Portanto nenhum homem público que tenha participado em algum momento do agrupamento social “dos que detém (ou detiveram) a caneta” pode reclamar da ausência de recursos inclusive intelectuais. Afora inclusive os recursos injetados aqui pela União em diferentes projetos e rubricas além desta verba, mas isto foge aqui desta reflexão. Utilizaram mal, por longos anos, porque o quiseram. Ou simplesmente o fizeram pela ausência de vestígio de um ethos que incorpore a noção de razão pública, onde política e moral unem-se.

(continua...)

George Gomes Coutinho – sociólogo e doutorando em sociologia política pela UENF


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