terça-feira, 1 de junho de 2010

Por que nós sempre perdemos para Garotinho? Parte I





A resposta a pergunta do título não é o mais importante aqui, essa é muito simples, ele sempre ganhou porque “entendeu” melhor a sociedade em que vivia do que seus opositores, o que inclui esse “nós”. Assim o mais importante aqui é responder primeiro “quem somos nós”. Sem saber quem somos, não sabemos que armas temos e nem como podemos lutar.

Ante mais um corriqueiro escândalo na planície lamacenta a comunidade blogueira convocou esse “nós” para entrar em ação. Excelentes textos como os de Douglas da Matta, Cláudio Andrade, Ricardo André, Professora Luciana entre outros, pediram para que esse “nós” sai à luta, abandone momentaneamente as divergências e se una para salvar nossa cidade. Mas afinal quem somos nós?

Num primeiro olhar não é muito difícil definir quem são esse “nós”, ao menos em traços gerais. Esse “nós”, pelo menos na sua versão mais recente, é uma classe já histórica em Campos, a qual despontou na política nos meados da década de 80, embalada pela onda de redemocratização e “diretas já” e que tinha no PT e no “brizolismo” seu lugar de origem político-partidária. E com o lento e sofrível desenvolvimento da cidade, também se expandiu sofrivelmente.

Uma outra característica marcante desta classe é que ela é a construtora e mantenedora da pequena, porém hoje robusta esfera pública da cidade, a blogesfera local é a maior manifestação disto. Essa esfera pública é a arena comum onde a política é feita através de idéias e debates. Esta classe (“nós”) é assim por excelência a portadora da virtude democrática na planície lamacenta, como também é o centro reflexivo do município.

Somos na maioria oriundos de setores da classe média (baixa classe média e média classe média) e temos como atividade principal no mundo, ou seja, ganhamos a vida, através de nosso conhecimento intelectual. Nossa grande maioria sobrevive da venda de conhecimento intelectual. Assim, memória, informação e idéias são as mercadorias que oferecemos na grande feira da vida. Somos formados majoritariamente por professores, advogados, jornalistas, estudantes entre outros. Há também outros entre nós que vendem mão-de-obra qualificada que não são diretamente vendedores de produtos intelectuais, como os profissionais da saúde.

No geral, duas características nos marcam, ou seja, formam nossa “Klassenlage” (situação de classe) como diria o velho Max Weber: vivemos de produtos intelectuais e em geral temos um ganho fixo de origem “impessoal” (não dependemos de favores pessoais).

Quanto ao primeiro, assim como banqueiros são hábeis em lidar com o dinheiro e usam esse dinheiro no jogo político, nós somos hábeis em produzir informações e usamos isso no jogo político, talvez essa seja nossa única arma.

E quanto ao segundo ponto, ele é fundamental. É esta segurança econômica provinda da não dependência diretamente pessoal do ganho que é tanto a fonte de nossa coragem como também a possibilidade (eu disse a possibilidade) de fazer política com interesses mais distantes do nosso umbigo. Com isso quero dizer que não acredito que se possa fazer política em prol do “bem comum”, sem interesses, ou portando valores universais, mas sim que, se podemos nos aproximar disso de alguma maneira, essa classe (“nós”) tem as condições materiais para isso, já que empresários, a grande mídia e algumas outras classes economicamente privilegiadas tem grandes interesses nos cofres do Estado para o sucesso de seus negócios, e as classes mais desprovidas devem ter o direito LEGÍTIMO de fazer política com o “estômago”, assim são de alguma maneira mais vulneráveis.

Voltando a fonte de nossa coragem, é a garantia que o “leite de nossas crianças” e ou a cervejinha do fim de semana não estão em jogo, que nos permite expressar nossas opiniões na esfera pública sem ter medo. Desse modo, é a “impessoalidade” do nosso ganho que nos permite agir no mundo político democrático, é isso que nos faz tão “bravos” e “altruístas”. Creio que isso deve explicar o porquê de Garotinho e suas extensões corpóreas que caminham por aí (corpos sem vontade própria) odiar concursos e convocar concursados. É essa relação de ganho impessoal que os concursos promovem que permite a formação do “nós”.
Continuarei no próximo post a falar das causas de nossa derrota.

11 comentários:

Roberto Torres disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Roberto Torres disse...

Primoroso Brand. Nao compreender quem somos, que "nós" é esse, nos leva necessariamente a reproduzir preconceitos sobre as pessoas que nao dispoem dos recursos e disposicoes que dispomos para criticar o garotismo. Condenar o voto das classes populares pelo fato de ser motivado por "interesses do estomago" é ver como única saída sua exclusao da política, o que seria alcancado, segundo creem, pela instituicao do voto facultativo. Democracia sem povo, eis a clássica proposta do liberalismo elitista de classes médias "ilustradas".

Enquanto a oposicao a Garotinho for feita sob este pano de fundo que leva a excluir os pobres da política ela sempre será derrotada. Na minha opiniao, deve e merece ser derrotada.

Brand Arenari disse...

Roberto, vc acerta em cheio e antecipa em parte a continuacao do meu post. Essa classe é pequena demais para querer impor sua visão de classe no jogo político. Ela precisa ter sensibilidade suficiente para ter um projeto para as outras classes abaixo delas socialmente, sem que isso seja baseado na tutela destas classes e nem na defasa velada do extermínio delas.
É preciso olhar para o lado, mas com olhos de ver, e não de recriminar.

Anônimo disse...

A foto é sacanagem com o botafogo!

Roberto Torres disse...

Mas acho que a foto tem sentido. A galera do "nós" contra o garotismo parece a torcida do botafogo: muito autoconsicente, mas incapaz de ser maioria.

Gustavo Carvalho disse...

Caro Brand, seu dianóstico sobre o impasse político fundamental está correto e lembra o dilema habermasiano da atuação na esfera pública partindo-se dos incluídos nas condições transcendentais "situação de fala ideal". Como influir os "corações e mentes" que se quer formulam seus interesses de forma discursiva-argumentativa ("consciência para si"), quanto mais num contexto sem esfera pública consistente no qual a assimitetria discursiva é o menor dos problemas. Do ponto de vista filosófico eu só teria uma crítica a fazer a seu argumento: do modo como está formulado para que os agentes sociais só são capazes de operar com "razões de 1ª ordem" (grosso modo: interesses) e que a referência às "razões de 2ª ordem" são somente efeito ou da boa consciência culpada ou recurso do cinismo utilitário. Acho que o jogo é sutilmente mais complexo e dialético (portanto impevisível).
Do ponto de vista pragmático, só nos resta apreder com o inimigo e criar uma política de comunicação na qual o rádio seja a ferramenta principal.
Abç

douglas da mata disse...

É um desafio, no sentido dessa cognição, que enfrento e compartilho, e penso que traduz sua preocupação, como bem te conheço:

1. Como calibrar o reconhecimento de nosso "papel", sem incorrer em messianismo vulgar, sem ceder ao complexo de vira-latas dos sem-representação formal, e construir uma esfera pública que se legitime "per si", mas que possua conexão teleológica com a realidade?
2. Qual é o tamanho de nossa influência, e pior, há como auferir esse tamanho e nossa "eficiência"?

Parece piada, mas, mais do que nunca, o bordão, "o que somos, de viemos e para onde vamos", é uma esfinge que nos devora a cada dia que hesitamos, misturando os mitos, e nos acorrentando como prometeu.

Saibam, estou bem próximo de tentar achar resposta. Acho que o caminho é parar de caminhar e esperar alguma condução oportunista.

"Cansado de correr na direção contrária, sem pódio de chegada, nem beijo de namorada"

Um abraço.

douglas da mata disse...

PS: para alimentar a dúvida:

A proposição da comissão processante pode ser considerada como resultado, também, da nossa pressão e debates? em que medida?

A fala do vereador processante, M.Bacellar sobre a blogosfera, com a posterior propositura é um sinal disso?

Sou todo ouvidos.

Brand Arenari disse...

Eu nem ia escrever a segunda parte, to sofrendo do mesmo desanimo do Douglas. Mas me animei com este debate e vou escrever. Aí respondo as questões.
Um grande abraço tds.

Anônimo disse...

Carta aberta a Marcos Bacellar

A política é o meio pelo qual o homem organiza a sociedade e a democracia surge. Primeiro na Grécia antiga, para fazer valer a voz de todos e a vontade geral prevalecer sobre a vontade de alguns, que até então dominavam tudo na base do grito, da força e de governos autoritários.
O mundo lutou e ainda continua lutando firme contra esses ditadores que querem transformar os mais humildes em seu súditos, mesmo aqui no Brasil, um país democrático e livre, ainda vemos esse tipo de situação, e em Campos não é diferente.
Aqui na cidade de Campos tem um vereador que é metido a machão e acha que todos temos que temer a força de seus capangas e o que eles podem fazer conosco, simples jovens cidadãos de Campos. Queremos ver uma cidade liberta desses covardes, mentirosos e monstros, que estão na política não para servir ao povo, mas para se servir dela.
Podem estar certos que não me escondo atrás deste blog ou destas linhas, sempre me mantive na linha de frente do embate político, e não será agora que irei fugir, ou me amedrontar.
Não permitirei que este Marcos Bacellar amedronte nosso povo com intuito de nos calar, quanto mais os seus ‘capangas’ nos ameaçarem, mais vamos gritar, quanto mais os seus seguranças nos rodearem, mais teremos força.
Quero uma Campos liberta desses covardes, que ao invés do debate político usam o terror e a ameaça para impor suas vontades.
Não, Campos não suporta mais isso. Daremos nossas vidas, meus companheiros e eu. Se for necessário derramaremos nosso sangue, mas Bacellar não vai nos amedrontar e tampouco irá nos fazer calar.
Não iremos parar de cobrar das autoridades Judiciais a apuração do desvio de mais de R$ 6 milhões de reais da Fundação Zumbi dos Palmares e dos mais de R$ 40 milhões da Campos Luz, onde o presidente era ligado ao vereador.
Bacellar, se sua intenção era nos amedrontar e nos silenciar, “deu tiro no pé”, pois agora gritaremos mais, denunciaremos mais e lutaremos mais, sem medo e com a força do povo.
A Voz da Juventude nem você, nem seus capangas irão calar.
Campos! Verás que um filho teu não foge à luta!!!

Brand Arenari disse...

Muito bonita a carta, o povo de Campos certamente ficará orgulhoso de uma juventude tao corajosa e aguerrida assim. Só pediria a vcs para incluírem alguns itens em suas revindicacoes, achei elas muito SELETIVAS.
Comece pedindo para que o povo de Campos tenha acesso "àquela fita" com gravacoes que garotinho nao deixa o povo de Campos ouvir, uma CPI ampla dos Royaltes incluindo o periodo Rosinha.
Acho que se vcs nao forem tao seletivos, terao mais credibilidade frente a populacao.
É só uma sugestao. . . um abraco.