domingo, 4 de maio de 2008

Ainda sobre moral e política

Por se tratar de um tema tão difícil e espinhoso como esse, iniciarei com uma simples metáfora, mesmo sobre o risco de perder um pouco a profundidade do tema. Quando nós procuramos um médico para solucionar algum mal de saúde grave, que características esperamos que esse médico tenha? Sem dúvida não esperamos dele apenas boa vontade e honestidade, precisa ser ele também competente, precisa ele de uma série de atributos relativos à tarefa que se propõe fazer que vá além dos primeiros citados, caso contrário estamos nós literalmente mortos. Caso tenhamos um montante de dinheiro para aplicar no mercado financeiro não entregaremos esse montante na mão de um homem que seja tão somente honesto não é? Da mesma maneira que não queremos que o centroavante da seleção brasileira seja apenas um bom homem, queremos que ele seja goleador. Isto é, nós não entregamos o que nos é muito caro na mão de homens simplesmente honestos e de boa vontade, por que então faremos isso com o governo da nossa cidade? Embora confiar nas pessoas seja algo muito importante, exigir delas capacidades compatíveis com o papel que ocupam também é muito importante.
No entanto o fundamental neste tema não é o conjunto de proposições ou provocações que eu coloquei acima, mas sim analisar o que engendra este sistema e essa forma de encarar política. A primeira delas se refere a algo que nós temos freqüentemente debatido neste blog, a saber, a precarização do debate político. Uma esfera política pobre de idéias como é a nossa, como também novelizada como nos mostrou Roberto, reflete esse quadro em que figuram “mocinhos” e “bandidos”, e a única proposta que aparece são acusações pessoais ou bravatas de quinta categoria, e por um outro lado, ou vários outros lados, ecoam as vozes em coro de uma moralização da política, como um choro lamurioso sem qualquer efeito.
Porém, ainda há mais um notável aspecto neste jogo, que podemos chamar de uma postura infantil do eleitorado. Ao esperar ansiosamente pela vinda de um quase messias, um homem puro de coração que ama sua cidade e seus cidadãos, e logo redimirá o nosso sofrimento, o eleitorado cria uma teia na qual ele próprio se aprisionará. Ao exagerar a importância dos atributos pessoais para a política, o eleitor reforça a lógica pessoal no jogo político, e abre um espaço para entrada de figuras pouco democráticas, centralizadoras e arcaicas. Creio que não é difícil pata o leitor visualizar isso em nossa história municipal. Ao crer que atributos morais que um indivíduo porta é o aspecto mais importante, deixando de lado a importância das idéias que um indivíduo representa, ficamos sempre reféns dessas figuras, presos a instabilidade que isso gera. Conquistas estáveis demandam a entrada de um grupo que traga em si para além dos costumeiros e normais sentimentos humanos como: ambição de poder, vaidade entre outros, traga também um conjunto de novas idéias significativas. Quando digo idéias, falo de algo que é anterior e mais importante do que certos projetos e ou proposições de certas políticas públicas ou proposições pontuais. Quando estes últimos são eficazes é porque são reflexos de uma mudança considerável de postura que, a despeito de valores morais requer novas idéias.
E por último vale ressaltar que isso reflete também como o eleitor nesta lógica crê que os problemas da política dizem respeito apenas aos políticos. Tecem acusações ou louvam heróis morais como se os próprios eleitores nada tivessem a ver com a vida da sociedade, são incapazes de se pensarem como agentes neste mundo e muitas vezes como corruptos também dentro da escala que estão enquadrados. Fogem da responsabilidade e projetam pra fora as causas dos problemas de nossa sociedade, se eximem da culpa, criando bodes expiatórios (neste caso os políticos), como também nos explicou o Roberto no seu post anterior. Mas isso é uma longa história, quis aqui apenas pontuar.

Um comentário:

Fabrício Maciel disse...

Muito lúcido Brand, quando um mau político estraga uma boa idéia com um mau comportamento, tende-se a descredenciar boas idéias por se achar que dependem sempre de boas ações, e logicamente de bons políticos. Nos resta continuar desenvolvendo boas idéias, e dentre elas o fato de que só alcançamos este alvo quando nos resguardamos o direito de não pensar em boas ações como algo indispensável para a viabilidade do debate.