quinta-feira, 8 de maio de 2008

Dos paroquialismos.

A discussão sobre transferência de votos nas próximas eleições municipais deveria ser mais debatida por aqui, tendo como horizonte da discussão o fato de que a família garotinho não está mais no controle do Estado do Rio. O governador Sérgio Cabral já deu mostras suficientes de que apoiará candidatos em consenso com o governo federal, isso, na capital do Estado, já ficou evidente. A idéia subjacente a este comportamento político é a do automatismo da transferência de votos de “cima” para “baixo”. Porém, historicamente, não se pode afirmar que o controle de um âmbito executivo acima transfira votos para baixo, ainda que o governante seja popular, com altos índices de aprovação. Não é automática a transferência de votos presidente-governador ou governador-Prefeito. Estes âmbitos apresentam dinâmicas diferentes, em parte pela proximidade do eleitor: a relação cara-a-cara pode distorcer qualquer alegada superioridade. Vejamos. O ex-governador Garotinho tinha uma ótima avaliação em 2000, ano das eleições municipais, o que não impediu que os candidatos por ele apoiados tivessem desempenho ruim e não alcançassem vitória. Foi o caso, por exemplo, de Conde no rio e de outros da região metropolitana e interior. Outro exemplo bastante repetido ocorreu em Minas, também nas eleições municipais de 2000, quando o então governador Itamar Franco, ex-presidente da república com alto índice de aprovação ao deixar o cargo (elegendo seu candidato), não impediu que seu aliado João Leite fosse derrotado em Belo-Horizonte. Nas últimas eleições para governador houveram outros casos, Lula e o PT tiveram desempenho muito ruim, apesar da surpreendente, e cada vez mais ascendente, aprovação do governo federal - na época sofrendo menos com as repercussões que as acusações de corrupção acarretavam - : não elegeram ninguém no sul e no sudeste. Pode-se buscar explicações para esta falta de automatismo na transferência de votos de “cima” para “baixo”, Vitor provavelmente tem algumas, suspeito que elas dependam, excluindo os aspectos contingentes, das condições políticas locais no que diz respeito às coligações, que determinam tempo de TV, por exemplo. Isto nos leva a pensar o quadro da disputa campista isoladamente, sem recorrer àquilo que “venha de cima”. Assim, é de se suspeitar que a próxima eleição municipal em Campos tenha que ser analisada pelos arranjos partidários que agora se estruturam para a corrida futura. Estes arranjos, ademais, podem cristalizar o quadro atual, de crise, e ir contra as possibilidades renovadoras que uma pretensa influência estadual e federal venha cogitar. Penso, portanto, ao contrário do que muitos aqui escreveram, que necessitamos nesse momento de uma análise paroquial das futuras eleições municipais, levando em conta as forças que neste momento se apresentam na disputa campista.
Fabrício Neves, Sociólogo, UFRGS.

9 comentários:

VP disse...

Bill,

Concordo que não seja automática essa transferência de votos. Contudo, ainda não cheguei a testar estatisticamente o tal up-down. É difícil separar esse fenômeno de forma que não seja por pesquisas de opinião. Ou seja, perguntar ao eleitor. Isso já foi feito, mas tem variação muito alta. Ainda mais diferenciar o que é da "maquina" (estrutura do Estado) daquilo que é da qualidade do que transfere (como popularidade, por exemplo).

O que posso afirmar com alguma clareza limita-se a transferência down-up. Ou seja, do prefeito para o candidato a presidencia. Apresentei isso junto com o Jairo Nicolau na Anpocs. O Lula teve melhores médias exatamente nos municípios administrados pelo PFL do que nos administrados pelo PT. Mesmo nas análises multivariadas que controlaram renda, educação e Bolsa Família, o fator do Partido do Prefeito não é significativo.
Em realidade, isso desmontou uma série de pressuposições brazilianistas, como a de que os "prefeitos-coronéis" controlavam suas bases como currais. Mostra muito mais uma eleição presidencial nacionalizada e que o eleitor consegue separar muito bem o que é local do que é nacional. Aqui podemos dizer que existem duas lógicas distintas (por mais que sejam interativas).
Quanto ao governo federal ter efeito sobre as eleições municipais, ainda não encontrei uma forma de separar também o fenomeno de dois candidatos da base de governo competindo. Isso é difícil. Pois como dizer que somente o PT será beneficiado nos municípios? Isso já vimos que em 2004 não foi tanto assim (os petistas esperavam mais de 800 prefeitos, fizeram a metade disso, se não me engano 460...). Esse seria o up-down. Mas não tenho clareza sobre isso. Metodologicamente tem muitas variáveis que não possuimos ainda formas eficazes (não por impossibilidade, mas por falta de grana de pesquisa mesmo).
Agora, vc cita o fato do Garotinho em 2000. Não sei. Mas em 2004 apenas 4 ou 5 prefeituras do interior não foram conquistadas pelos candidatos apoiado pelo Governador. Mas aí vem novamente a pergunta: o Garotinho ou Governo do Estado?

Enfim, um papo longo. Bom que vc colocou jogou na roda de samba. Espero agora a opinião do Renato. Ele tem vários insights sobre isso.

Abraços,

Vitor Peixoto

bill disse...

Vitão,
Em relação ao Garotinho (ou seu governo), li que houve uma concentração de seu eleitorado nos pequenos municípios, por isso argumentei pelo seu insucesso, já que não conseguiu a capital ou as cidades da área metropolitana, geralmente priorizadas... Sobre o Garotinho ou governo em 2004: Ele é do interior do Estado, ao passo que Sérgio Cabral é da capital, aqui me parece que a própria trajetória política em contextos diferenciados pode influir no resultado, e talvez, sérgio Cabral não tenha o mesmo desempenho que o anterior.

Abraço

VP disse...

Bill,

Particularmente, acho que as próximas eleições municipais nos servirão muito mais para testar nossas proposições acerca desse fenomeno do que as passadas podem ajudar para entender essa eleição. Não sei se me fiz claro, quero dizer que as outras eleições passadas dirão pouco com será essa próxima. Mas os resultados da próxima serão importantíssimos para compreedermos as que virão, ou até mesmo as passadas.
Como Garotinho não possui mais a máquinha do Estado, como será a sua influência no interior? Se ele era o responsável pela eleição daqueles prefeitos de 2004, terá de ser agora também. Ou então quem elegeu aqueles foi a máquina e não Garotinho.
Sinto muito a falta de estudos sobre o tal fenomeno garotinho. Óbvio, isso virá com o tempo. É recente, eu sei. Seria desonestidade minha comparar com os estudos sobre o carlismo, por exemplo. Mas está aí um excelente tema para o curso de sociologia política da UENF.
Todos nós creditamos ao Garotinho uma força impressionante. Mas até onde vai essa força? O seu avanço à política Estadual não pode ser entendida sem o capital herdado do Brizolismo também. Concordo que ele soube aproveitar muito bem e se criou nesse cenário (ele e não os outros como César Maia, por exemplo, por mais que tenham tentado).
Outra: será que a influência de Garotinho, sem máquina, não se restinge a Campos? Quando tinha o Governo do Estado influenciou muito (lembra de Itaperuna?), acho que somente em Miracema e Bom Jesus foram surpresas contrárias ao seu poderio. Mas e agora sem a Máquina, será que algum candidato fora de Campos o convidará para o palanque contra o Sergio Cabral? Podem até ser do mesmo partido, mas já separados?

Não poderemos deixar de analisar a influência de Sérgio Cabral também. Será que ele com a máquina terá o mesmo poderia do Garotinha na mesma situação? Ou mesmo, será que fará escolhas e apoiará explicitamente como fez Garotinho ou se comportará como Lula que não subirá em palanque onde houver dois candidatos da base?

O jogo de xadrez está aí. Veremos... eu tenho muitas dificuldades para fazer análises de conjuntura. Mas é muito interessante, afinal, somos profissionais com ligações emocionais com o que analisamos, né mesmo? Impossível passar incólume!

Grande abraço,

Brand Arenari disse...

Acho impressionante tb o fato de nao termos estudos sobre garotinho.
Alem de nos perguntarmos até onde vai a sua forca, seria bom perguntar tb da onde vem.
Quem sabe a uenf um dia responderá. . .

George Gomes Coutinho disse...

Concordo que ainda falta analisar o fenômeno Garotinho.

E adianto em dizer que pelo que sei a UENF ainda não tem algo sistemático para a análise do fenômeno pelo que acompanho.. Só indiretamente há um estudo sobre imprensa local em que de alguma forma o Garotinho, claro, será de alguma forma tangenciado.

Inclusive creio que as excelentes questões do Vitor não terão resposta por enquanto.. Digo respostas mediante esforço sistemático de pesquisa. O que podemos é tentar elaborar uns esboços aqui né?

E, tocando na questão do Bill, será que investimentos em programas sociais, como o Bolsa Família, não podem desarrumar os arranjos clientelistas locais gerando resultados surpreendentes? Digo isso porque em Campos, como já disse, o Bolsa teria uma cifra de quase 25000 famílias atendidas...

bill disse...

Parte da força que o Garotinho alcançou fora de seu reduto eleitoral advem do apoio que recebeu do PT em 98 para que a aliança PT-PDT saísse. Na época o PT estadual por meio de eleição elegeu Wladmir Palmeira como candidato, sofrendo imediatamente intervenção do diretório nacional. O monstro começava a ser gestado... Tempos depois o rompimento da aliança, mas Garotinho já havia sido eleito... Vitor se lembra de nossas esperanças de que com a vitória da chapa, a FENORTE fosse extinta: não foi quando o governo era Garotinho (Boynard na presidência) e nem quando Benedita assumiu (acho que um Eduardo (????)foi indicado para presidente). Uma comédia de erros. Garotinho deve muito ao PT...

Brand Arenari disse...

Bill, muito bem lembrado, garotinho deve muito ao pt, desde a 1 eleicao pra prefeito em 89. É sem dúvida uma história de amor.

Brand Arenari disse...

Bill a gente poderia fazer um post sobre isso, o problema é que nós sabemos pouco sobre a eleicao de 89. Por motivos óbivos (ahahaha) acho q só o Renato tem uma nocao legal dela. Ou o Xacal postar alguma coisa lá no Blog dele sobre o PT e Garotinho na eleicao municipal de 89. Nao podemos esquecer que goratinho já foi do pt, e foi candidato a vereador pelo pt.
George, quanto a uma resposta da UENF é melhor esperar sentado.

xacal disse...

O xacal se alimenta de provocações, vamos lá...

Em 1988 garotinho contou com apoio de setores "progressistas" do PT, alguns deles até romperam formalmente com o Partido, que lançou candidatura própria, Luis Antonio (já falecido,ainda bem)...

Naquela época já existia um traço do PT que permanece até hoje, pelo menos, com mais força aqui na taba goitacá: a máquina partidária nunca foi controlada pelos setores mais "conseqüentes", ou melhor, mais sintonizados com movimentos políticos originais...

E tal distinção é sempre identificada por cada lado com pejorativos: os bu(rr)ocratas e os "iluminados"...

Esses quadros partidários encamparam o MUDA CAMPOS a despeito de sacrificar um tema caro aos petistas, naquela época muito, hoje nem tanto...a democracia partidária e a fidelidade a essas decisões democráticas...

Não basta, como fazemos agora, denunciar que os majoritários utilizam métodos não ortodoxos para conquistar esse controle...

Essa não é toda a verdade...uma parte do partido, ao longo da sua hsitória, garantiu nossa sobrevivência orgânica por se dedicar com afinco a tarefas que ninguém gosta (como fazer ciência com números, né Vitor?)...

E princípios são princípios...mesmo que não sejam operados na sua totalidade como preconizam...mas permanece a referência...

Quer dizer, por mais nefastas que sejam as eleições no PT, muito pior seria um partido de caciques...

De volta ao assunto...garotinho...
Esse embate deixou cicatrizes profundas no partido, que se ressente delas até hoje, afinal não é nada fácil operar política na terra do governador, e do candidato terceiro colocado em uma eleição presidencial...

Após a eleição em 1988 houve um previsível racha no MUDA CAMPOS e o PT de forma oportunista acolheu os dissidentes (o vice-prefeito Adilson Sarmet, médico, e que dava viés classe média ao MC) e isso cristalizou as feridas...

Nesse tempo, garotinho já experimentava a fama de fenômeno das urnas, que inclusive tinha sido testada em 1982, quando foi o quarto ou quinto mais votado para vereador pelo PT, mas não obteve o coeficiente partidário (legenda)...
garotinho foi no pt a maior expressão daquela disputa burocráticos x quadros eleitorais...
ele é o resultado de uma esquizofrenia do pt...ele se cansou e saiu, pois não via um cenário compatível com seus planos...e estava certo...!



Sempre carecemos de uma base social forte...e por motivos óbvios: nossa economia não gerou movimentos sociais enraizados porque também é frágil e improvisada...

Nossos maiores sindicatos estavam no funcionalismo público, que não bastou para nos sedimentar...

Por outro lado, nunca debatemos de forma profunda as razões desse imobilismo...tais temas eram "tabus", e discutí-los era enfraquecer perante a "direita"...

Já em 1998, quando se elegeu governador, garotinho costurou um acordo com Zé Dirceu que entalou, e corrompeu mais uma vez a "democracia" partidária em nome de uma estratégia maior (e isso é verdade)...o problema é que os prejuízos para a coesão do partido são tão graves quanto os possíveis avanços...

Desta forma, o pt mantém sua cambaleante trajetória em Campos dos G. (para aqueles que reclamam da minha formalidade aqui)de oscilar entre combater garotinho ou aderir a ele...

A bem da verdade, o pt, aqui em campos, oscila sempre em combater ou aderir...ele nunca É a opção...

Agora com o desenrolar do governo lula, e da extinção (pelo menos por enquanto) de qualquer interlocução garotinho x lula, o pt de campos mais uma vez "obedece" a lógica externa...

Não se trata de defender aliança com garotinho, não me entendam mal...
mas a interlocução política pressupõe, e vcs sabem melhor do que eu, em artcular com espectros em diferentes...ou José Sarney representa no Maranhão algo muito diferente de Garotinho...?

Para encerrar...o que falta ao pt campos é ousadia e coragem para construir seus próprios caminhos, mesmo que errados...

Ufa...!chega, já até me perdi...