Tecerei aqui brevemente alguns comentários sobre velhas categorias de análise, tão velhas que tem sido até um pouco esquecidas. A isso me refiro à noção de classe social. O que a noção de classe social pode nos ajudar neste debate? Para não ser confundido com o velho sentido que Marx deu a estes termos, usarei o termo estrato social. Denotando desse modo, que quero estar mais sintonizado com as modernas formas de apreensão deste conceito. Mas para falar sobre isso, voltarei a alguns comentários que já fiz sobre os últimos anos da política campista, onde creio que resida uma considerável parte das origens dos atuais acontecimentos.
Na década de 80, em que pela primeira vez forças puramente urbanas entraram na disputa pelo poder municipal, elas estavam divididas em dois segmentos: um mais progressista, representado pelo PT e sustentado, sobretudo, por profissionais deslocados das relações tradicionais de trabalho, no qual o Cefet tinha um papel de destaque; e por outro lado, um segmento que também se valia da crescente urbanização, mas buscava apoio nas massas da periferia urbana “recém” chegada do campo. E esse grupo, liderado por Garotinho foi o que venceu, com uma proposta não progressista como era a do PT, mas com um viés populista e pseudo-progressista. Garotinho não era a oposição ao poder tradicional dos usineiros e proprietários de terra, como muitos pensavam, ele era tão somente a versão modernizada dessa forma de poder, soube arregimentar o ressentimento de uma nova classe social que surgia, a saber, “a periferia urbana”. Ele teve sucesso porque entendeu o momento político mais do que ninguém. Mas quando nós deslocamos a análise das personalidades, outros aspectos, ás vezes até mais importantes, começam a aparecer.
Assim como nos conta Habermas em “mudança estrutural da esfera pública” ou sobre um outro período da modernidade nos fala Klaus Eder em “ a novo política de classes”, as classes médias tiveram papel fundamental no cenário político, foram elas forças modernizantes, não por coincidência foram elas por muito tempo a base de votos do PT. Mas de onde vem está força? Certamente os membros deste estrato social não são por sua natureza mais éticos, ou mais morais ou mais cristãos que os outros, porém a posição que se encontram nesta dinâmica os permitem tomar certas posições poucos comuns. Como já ouvimos mil vezes por aí, política não é um palco onde desfilam anjos, mas sim homens. E a metáfora bíblica nos ensina que nós não herdamos os genes de Abel, mas sim de Caim. O nosso “pai” comum foi aquele que matou seu próprio irmão para satisfazer seus interesses. Por isso, para analisar a política, olhar para a dinâmica dos interesses parece ser bastante razoável.
Aí que a dinâmica de interesse de classe tem algo a nos revelar. A primeira delas é o que mais ouvimos por aí. De forma equivocada as pessoasa colocam a culpa da precarizacao da política nas costas dos setores menos privilegiados. “Menos privilegiados” é o eufemismo que eu uso para me referir à categoria de pessoas que vale menos na escala de valores humanos segundo as avaliações de nossa sociedade (mas isso é papo pra outro debate). Na lógica da política, é mais interessante para essa gente garantir uns tijolos para construir a casa, ou uma “boquinha” para seguir vivendo, do que esperar pacientemente pela “revolução”, e isso é altamente compreensível, por mais que tenha efeitos a longo prazo ruins para todos. Mas como nos lembrou Roberto Moraes em seu blog, não é somente esses estratos que tem interesses materiais no jogo político, há lobistas e empresários de toda ordem que fazem o mesmo jogo, com uma simples diferença, o valor das trocas. Mas em essência, determinados setores empresariais e a “ralé estrutural” (como chama o sociólogo Jessé Souza) estão em pé de igualdade, ambas dependem da política para sobreviver. E quem sobre neste jogo? Justamente aqueles que não dependem da política para sobreviver. Aqueles setores chamados de médios, que normalmente ocupam cargos aos quais não estão dependentes de nenhuma forca pessoal, não tem nomes, são eles apenas números que se perdem na burocracia. Em Campos, como mencionei no meu primeiro post, a antiga escola técnica federal teve um papel fundamental na formação destes setores, nos deu um tipo de gente que rompia com o modelo das tradicionais relações. Mas mesmo assim, foram estes estratos que não dependem da política, pequenos em número, e sobretudo em força, nunca hesitaram em participar como coadjuvantes de quinta categoria no governo daqueles que venceram a primeira batalha, que se apoiavam no populismo.
O que sobre disto é que política só alcança seus objetivos mais nobres quando atores que não dependem diretamente dela ganham espaço no jogo, para essa gente determinados idéias e interesses coletivos não são um empecilho para sua sobrevivência. Devemos pensar também porque em toda nossa história municipal a dicotomia foi sempre entre uma elite tradicional e uma massa de clientes, nunca houve uma classe intermediária que retirasse seu sustento através de relações não pessoais num número e força considerável que pudesse dar outros contornos a história política.
Continua. . .
Na década de 80, em que pela primeira vez forças puramente urbanas entraram na disputa pelo poder municipal, elas estavam divididas em dois segmentos: um mais progressista, representado pelo PT e sustentado, sobretudo, por profissionais deslocados das relações tradicionais de trabalho, no qual o Cefet tinha um papel de destaque; e por outro lado, um segmento que também se valia da crescente urbanização, mas buscava apoio nas massas da periferia urbana “recém” chegada do campo. E esse grupo, liderado por Garotinho foi o que venceu, com uma proposta não progressista como era a do PT, mas com um viés populista e pseudo-progressista. Garotinho não era a oposição ao poder tradicional dos usineiros e proprietários de terra, como muitos pensavam, ele era tão somente a versão modernizada dessa forma de poder, soube arregimentar o ressentimento de uma nova classe social que surgia, a saber, “a periferia urbana”. Ele teve sucesso porque entendeu o momento político mais do que ninguém. Mas quando nós deslocamos a análise das personalidades, outros aspectos, ás vezes até mais importantes, começam a aparecer.
Assim como nos conta Habermas em “mudança estrutural da esfera pública” ou sobre um outro período da modernidade nos fala Klaus Eder em “ a novo política de classes”, as classes médias tiveram papel fundamental no cenário político, foram elas forças modernizantes, não por coincidência foram elas por muito tempo a base de votos do PT. Mas de onde vem está força? Certamente os membros deste estrato social não são por sua natureza mais éticos, ou mais morais ou mais cristãos que os outros, porém a posição que se encontram nesta dinâmica os permitem tomar certas posições poucos comuns. Como já ouvimos mil vezes por aí, política não é um palco onde desfilam anjos, mas sim homens. E a metáfora bíblica nos ensina que nós não herdamos os genes de Abel, mas sim de Caim. O nosso “pai” comum foi aquele que matou seu próprio irmão para satisfazer seus interesses. Por isso, para analisar a política, olhar para a dinâmica dos interesses parece ser bastante razoável.
Aí que a dinâmica de interesse de classe tem algo a nos revelar. A primeira delas é o que mais ouvimos por aí. De forma equivocada as pessoasa colocam a culpa da precarizacao da política nas costas dos setores menos privilegiados. “Menos privilegiados” é o eufemismo que eu uso para me referir à categoria de pessoas que vale menos na escala de valores humanos segundo as avaliações de nossa sociedade (mas isso é papo pra outro debate). Na lógica da política, é mais interessante para essa gente garantir uns tijolos para construir a casa, ou uma “boquinha” para seguir vivendo, do que esperar pacientemente pela “revolução”, e isso é altamente compreensível, por mais que tenha efeitos a longo prazo ruins para todos. Mas como nos lembrou Roberto Moraes em seu blog, não é somente esses estratos que tem interesses materiais no jogo político, há lobistas e empresários de toda ordem que fazem o mesmo jogo, com uma simples diferença, o valor das trocas. Mas em essência, determinados setores empresariais e a “ralé estrutural” (como chama o sociólogo Jessé Souza) estão em pé de igualdade, ambas dependem da política para sobreviver. E quem sobre neste jogo? Justamente aqueles que não dependem da política para sobreviver. Aqueles setores chamados de médios, que normalmente ocupam cargos aos quais não estão dependentes de nenhuma forca pessoal, não tem nomes, são eles apenas números que se perdem na burocracia. Em Campos, como mencionei no meu primeiro post, a antiga escola técnica federal teve um papel fundamental na formação destes setores, nos deu um tipo de gente que rompia com o modelo das tradicionais relações. Mas mesmo assim, foram estes estratos que não dependem da política, pequenos em número, e sobretudo em força, nunca hesitaram em participar como coadjuvantes de quinta categoria no governo daqueles que venceram a primeira batalha, que se apoiavam no populismo.
O que sobre disto é que política só alcança seus objetivos mais nobres quando atores que não dependem diretamente dela ganham espaço no jogo, para essa gente determinados idéias e interesses coletivos não são um empecilho para sua sobrevivência. Devemos pensar também porque em toda nossa história municipal a dicotomia foi sempre entre uma elite tradicional e uma massa de clientes, nunca houve uma classe intermediária que retirasse seu sustento através de relações não pessoais num número e força considerável que pudesse dar outros contornos a história política.
Continua. . .
7 comentários:
Caro Brand,
Do seu texto, muito bom aliás, como sempre, restaram algumas dúvidas as quais compartilharei com você, na tentativa de elucidá-las:
1- a tese de que a não dependência, orgânica e material, da política como meio para sobreviver gera pessoas mais comprometidas com os interesses coletivos não resvala no discurso que procura "punir" os "políticos profissionais" como seres danosos a gestão pública...?
2-Não é esse discurso que até pouco tempo atrás inviabilizava o próprio Lula...?
Na minha opinião, o vínculo tansitório e pracário que você propõe, ou pelo menos assim entendi, também pode gerar a necessidade de formar uma "poupança rápida" para justificar o tempo e dinheiro perdidos (salários na administração são, em regra, menores)...
O fato de ter uma referência social e econômica que permita seu retorno a "vida normal" depois de encerrado o período no serviço público é positivo, mas nem sempre garante a incolumidade dos interesses coletivos...
Lembre-se que todo o primeiro escalão da economia de FHC, e de outros governos, se locupletam das posições e informações que detinham...
Acho que devemos também pensar melhor nos interesses... não reduzí-los aos interesses econômicos ou políticos. Acho que há também um outro nível de interesses que está ligado aos nossos valores, e eles podem ou não entrar em conflito quando a efetivação deles se dá no âmbito político. Acho que muitos que estavam nos altos escalões do governo FHC tinham, por exemplo, valores cívicos, e buscaram sua efetivação... E também aqueles do governo Lula que foram caçados. Acho que na crise Campista deve ter esta contradição entre a vida política dos valores cívicos e a vida econômica dos valores instrumentais.
Xacal, confesso que tive um pouco de dificuldade para entender algumas de suas questões, por isso darei uma resposta geral, me defendendo de antemão ahahah, mas as responderei posteriormente com calma, caso seja necessário.
A primeira coisa a ser dita sobre o texto é que pelo espaço curto parece que defendo uma visão mecânica e simplista da sociedade, tiramos uma peca colocamos outra e td acontece. Sabemos não é assim. O texto é um convite para pensarmos essas categorias. Ao lado disso, entram inúmeros outros fatores, inclusive aquela tal de vontade político q vcs gostam tanto de falar e nós aqui do blog temos evitado. Mas em relação a isso e a sua pergunta, posso dizer que não é pelo simples fato de um indivíduo não depender diretamente da política que fará com que ele seja um agente daquilo que nós chamamos de boa política, mas este fato é, sem dúvida um grande possibilidade para que isso aconteça. Ou será que é mera coincidência que a maioria das pessoas que estão nos debates dos blogs em Campos não depende da política para sobreviver. Ou será coincidência que dentre tantos prefeitavéis para a próxima eleição em Campos, os dois que representam uma visão mais moderna de política sejam professores universitários que não dependem da política para sobreviver, e nem estavam alocados em formas de relação de trabalho tradicionais, me refiro a Sérgio Diniz e a Roberto Moraes. Termino com essa, depois falo mais. . .
Tem que se discutir Tb o que entendemos por classe média, e outro assunto longo. . .
Bill, eu faco meia culpa por ter carregado a tinha nos interesses economicos. Comecei dizendo que iria me afastar do conceito de classe de Marx, mas nao deu tempo, acabei ficando praticamente só nele. Fica pra próxima.
Soube dos outros prefeitáveis agora, pergunto à distância: não há possibilidade deles comporem chapa, já que apresentam forças políticas diferentes das que estão aí?
Caro Brand,
Espero que tenha lido o meu comentário no seu texto do editorial da Folha.
Estamos juntos!!!
Abraços,
Felipe Diniz.
Filipe, só vi agora,valeu meu amigo, Grande abraco!
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